Parlamentares negras do Pará sofrem ameaças de morte; polícia investiga o caso

As parlamentares receberam mensagens com ofensas racistas e ameaças de morte (Divulgação)
Michel Jorge – Da Revista Cenarium

BELÉM (PA) – As ameaças recebidas pela primeira deputada estadual a se declarar negra na história da Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), Lívia Duarte (PSOL), e a vereadora de Belém Bia Caminha (PT), já estão sendo investigadas pelas autoridades da segurança pública do Estado do Pará e pela Polícia Federal (PF). As parlamentares receberam, no início desta semana, mensagens com ofensas racistas e ameaças de morte.

Trecho da ameaça direcionada à deputada Lívia diz: “você vai visitar Marielle Franco”, vereadora carioca assassinada em 2018. Já a ameaça enviada via e-mail à vereadora petista Bia Caminha afirma que a parlamentar será “eliminada em breve” e se encontrará com Marielle Franco, em uma evidente manifestação de ódio e violência política.

As ameaças denotam o inconformismo pela luta antirracista, feminista e anti-homofóbica empreendida pela deputada desde o mandato como vereadora de Belém – de 2020 a 2022. Em nota, a equipe de Lívia disse que “reivindicar direitos incomoda alguns, que, possivelmente, se sentem ameaçados, de alguma forma, com a perda de seus microespaços de dominação. Preferem que nós permaneçamos subservientes e invisibilizados. E, para impedir a nossa luta, a qualquer custo, alguns fogem ao campo da disputa política, abandonam o bom senso e optam pela criminalidade”.

PUBLICIDADE
Deputada estadual Lívia Duarte (PSOL) sofre ameaças de morte (Divulgação)

Militância

A deputada estadual tem se posicionado duramente contra os atos criminosos e antidemocráticos registrados no dia 8 de janeiro deste ano, em Brasília (DF), quando foram invadidos e depredados o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e a sede do Supremo Tribunal Federal (STF). Ela também atua nas pautas e direitos ligados às minorias políticas, como mulheres, negros e negras e da população LGBTQIAP+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexuais, Assexuais, sendo que o símbolo “+” acolhe as demais orientações sexuais).

Militante socialista, feminista e antirracista desde os 13 anos, Lívia foi a primeira presidente municipal negra do PSOL, no Brasil, e é fundadora do Setorial de Mulheres do Partido Socialismo e Liberdade. Também é autora do Projeto de Lei (PL) que proíbe homenagens a escravocratas e genocidas em Belém. A parlamentar também criou a Frente Parlamentar de Combate à Fome, que prevê uma série de ações parlamentares voltadas ao combate da insegurança alimentar da população belenense. Desde cedo, milita com o filho nos braços, e a experiência da profusão de tarefas e jornada extenuante acabou por esculpir seu perfil de ativista contra as múltiplas violências que atingem as mulheres, notadamente as negras, desde a mais tenra infância.

Leia também: Nos EUA, deputada do Pará participa de debate sobre clima e economia

Bia Caminha

A vereadora, que é vice-presidente estadual do PT-PA, foi eleita a vereadora mais jovem da história de Belém e mais votada do Norte do País, pelo PT, aos 21 anos, com atuação política em defesa da Amazônia, mulheres, negros e negras, juventudes e da população LGBTQIAP+. A movimentação combativa da parlamentar e militante a tornou alvo de grupos de extrema-direita que, ao longo de sua trajetória política, tentam interromper tudo que a vereadora representa.

Em nota, o Diretório Nacional do PT disse que “a violência política contra mulheres negras e LGBTQIAP+ tem sido arma dos grupos de extrema-direita por todo o Brasil, e que não aceitam que parlamentares como a vereadora Bia Caminha ocupem e existam na política. O Partido dos Trabalhadores (PT) se solidariza e comunica que já está tomando as medidas cabíveis para garantir a proteção da vereadora”.

Bia Caminha, vereadora petista também alvo das ameaças (Divulgação)

Violência política

Pesquisa do Instituto Marielle Franco, divulgada em dezembro de 2020, entrevistou 142 mulheres negras, de 21 Estados, em todas as regiões do Brasil, e de 16 partidos. Do total, 80% das candidatas negras sofreram violência virtual, 60% sofreram violência moral ou psicológica e 50% sofreram violência institucional. Das entrevistadas, 18% receberam comentários e/ou mensagens racistas, ou sexistas, em suas redes sociais, por e-mail ou aplicativos de mensagens e 8% foram vítimas de ataques com conteúdo racista durante transmissões virtuais.

Além disso, 60% das mulheres negras entrevistadas foram insultadas, ofendidas ou humilhadas em virtude de atividade política nas eleições. Em 45% dos casos de violência virtual e moral, a agressão foi feita por indivíduo ou grupo não identificado, o que dificulta denúncias e aumenta a impunidade nos casos desse tipo de agressão.

Dentre as entrevistadas que realizaram algum tipo de denúncia, 70% afirmaram que a denúncia não ajudou no esclarecimento do caso e nem trouxe mais segurança para o exercício da atividade político-partidária.

Marielle Franco

Marielle Franco, ex-vereadora no Rio de Janeiro, foi uma mulher negra, socióloga, com mestrado em Administração Pública. Eleita vereadora da Câmara do Rio de Janeiro, com 46.502 votos. Presidiu a Comissão da Mulher da Câmara. No dia 14 de março de 2018, foi assassinada em um atentado ao carro onde estava. Treze tiros atingiram o veículo, matando também o motorista Anderson Pedro Gomes. O que aconteceu depois é que Marielle tornou-se um dos mais importantes símbolos da luta popular no Brasil.

Nas últimas semanas, em um movimento articulado, houve um aumento na disseminação de mensagens de ódio em todo o País. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do STF, Alexandre de Moraes, afirmou na terça-feira, 18, que o modus operandi dessas mensagens é idêntico ao de 8 de janeiro.

Leia também: Morte de Marielle Franco completa cinco anos; relembre a trajetória da vereadora
PUBLICIDADE

O que você achou deste conteúdo?

Compartilhe:

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie. Leia as perguntas mais frequentes para saber o que é impróprio ou ilegal.