Petrobras pede para explorar petróleo na foz do Amazonas e Ibama nega

Tanques da Petrobras (Reprodução/Internet)
Da Revista Cenarium*

BRASÍLIA e SÃO PAULO – O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho, acompanhou parecer técnico do órgão e negou nesta quarta-feira, 17, um pedido feito pela Petrobras para perfurar a bacia da foz do rio Amazonas com objetivo de explorar petróleo na região.

A decisão foi tomada após o Ibama demonstrar preocupação com as atividades da petroleira em uma região de vulnerabilidade socioambiental.

A foz do Amazonas, na costa do Brasil e da Guiana Francesa (Elsa Palito/Greenpeace Brasil)

“Não restam dúvidas de que foram oferecidas todas as oportunidades à Petrobras para sanar pontos críticos de seu projeto, mas que este ainda apresenta inconsistências preocupantes para a operação segura em nova fronteira exploratória de alta vulnerabilidade socioambiental”, diz Agostinho no documento.

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A perfuração inicial era alvo de pressão da Petrobras, do Ministério de Minas e Energia e até do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que é do estado onde fica o local que a empresa pretendia perfurar.

Como mostrou a Folha, no entanto, o Ibama já vinha indicando que faltavam estudos que comprovassem que a perfuração, mesmo que inicial e para estudos, não tivesse impacto ambiental.

O Ibama apontou especificamente a falta da chamada Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS). A Petrobras argumenta que o estudo não é obrigatório e que protocolou outros que demonstram a viabilidade do empreendimento.

Mas o parecer cita a ausência da AAAS como um importante obstáculo para licença, uma vez que o potencial de impacto do empreendimento é grande e que a análise seria relevante por se tratar de uma nova frente de exploração dos recursos naturais brasileiros —essa seria a primeira vez que tal atividade seria liberada na região.

O Ibama afirma que a região da bacia da foz do Amazonas é de extrema sensibilidade socioambiental por abrigar unidades de conservação, terras indígenas, mangues e grande biodiversidade marinha.

Segundo o órgão, a área abriga espécies ameaçadas de extinção, como boto-cinza, boto-vermelho, cachalote, baleia-fin, peixe-boi-marinho, peixe-boi-amazônico e tracajá.

O processo de licenciamento ambiental do bloco FZA-M-59 foi iniciado em 4 de abril de 2014, a pedido da BP Energy do Brasil, empresa originalmente responsável pelo projeto. Em dezembro de 2020, os direitos de exploração de petróleo no bloco foram transferidos para a Petrobras, que teve o pedido de licença definitivamente negado nesta quarta-feira.

É a segunda negativa para atividades de perfuração na região —em 2018, o Ibama negou a emissão de licença para cinco blocos sob controle da empresa Total.

A exploração da foz do Amazonas era tida por ambientalistas como um dos empreendimentos de maior potencial de impacto no país atualmente, junto com o asfaltamento da BR-319 —rodovia que corta a Amazônia— e a Ferrogrão (projeto de ferrovia que tem como objetivo escoar a produção de grãos do Centro-Oeste por portos da região Norte).

Após o anúncio da negativa, o Observatório do Clima, rede de entidades voltadas à agenda climática, afirmou em nota que a decisão do Ibama protege um ecossistema virtualmente desconhecido e mantém a coerência do governo Lula.

“O presidente do Ibama agiu tecnicamente e de maneira correta, mas a decisão neste caso enseja um debate mais amplo sobre o papel do petróleo no futuro do país. O momento é de estabelecer um calendário para a eliminação dos combustíveis fósseis e acelerar a transição justa para os países exportadores de óleo, como o Brasil, e não de abrir uma nova fronteira de exploração”, diz Suely Araújo, especialista-sênior em políticas públicas da entidade e ex-presidente do Ibama.

Decisão técnica

Na segunda-feira, 15, durante seminário organizado pela Folha, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede), disse que a decisão sobre o pedido da Petrobras para perfurar a foz do Amazonas dependeria de critérios técnicos que considerassem a sustentabilidade ambiental, social e econômica.

A afirmação foi feita no evento online Desafios do governo Lula para ambiente e clima, realizado com apoio da Open Society Foundations. O debate foi mediado pelos jornalistas Cristiane Fontes e Marcelo Leite.

Ainda na segunda, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), havia defendido em outro evento a possibilidade de a empresa estudar a bacia da foz do Amazonas. O emedebista também esteve no seminário organizado pelo jornal, mas em um segundo painel.

Marina participou da conversa ao lado de Tereza Campello, diretora socioambiental do BNDES, Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, e Mauricio Terena, assessor jurídico da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).

“É inegável que tenha altíssimo impacto ambiental, simbólico e político”, disse a ministra sobre a exploração na região.

Marina afirmou ainda que o Ibama tem autonomia em processos de licenciamento e que nunca foi pressionada a conceder licenças por decisão política. “No caso de Belo Monte, durante minha gestão, [a licença] foi reencaminhada para estudos”, disse.

O Ibama concedeu licença à construção da hidrelétrica apenas em fevereiro de 2010, quase dois anos depois de Marina deixar o segundo governo Lula. Sua posição contrária ao projeto foi, aliás, motivo de desgaste com o presidente e desencadeou sua saída da pasta à época.

Outro ponto levantado por Marina foi a necessidade de diminuir a pegada de carbono nas exportações brasileiras. Ela elogiou a atenção ao meio ambiente nos acordos firmados entre Lula e o líder chinês Xi Jinping e argumentou que o país asiático vai deixar de importar produtos de carbono intensivo. “Com isso, todo o mundo vai ter que fazer o dever de casa. Nós podemos ficar trancados pelo lado de fora se o Brasil não compreender que precisa exportar produtos de baixo carbono.”

Internamente, por outro lado, a China é um dos países que mais emitem CO2.

Os painelistas destacaram ainda a importância de um trabalho conjunto entre ministérios para reduzir a derrubada de florestas. “O desmatamento na Amazônia foi criado em grande parte pelo avanço da pecuária. Se não houver um ministério que cuide desse setor da economia e aja pela redução, fica muito difícil ter sucesso”, afirmou Astrini.

(*) Com informações da Folhapress

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