‘Símbolos do Brasil’: Ipês estão ameaçados de extinção, segundo relatório da Forest Trends

Os ipês não têm mostrado recuperação populacional suficiente, após anos de exploração madeireira (Reprodução/Gabriel Beleia)

Ana Carolina Beauvoir – Da Revista Cenarium

MANAUS – As populações de ipês diminuíram severamente nos últimos 30 anos e podem desaparecer da Amazônia, é o que aponta o relatório divulgado pela Forest Trends em março de 2022. A típica árvore de grande variedade de espécies é considerada símbolo do Brasil por sua beleza, exuberância das flores e ampla distribuição em todas as regiões.

Mas toda essa beleza pode ter um fim trágico. Isso, porque os ipês não têm mostrado recuperação populacional suficiente após anos de exploração madeireira e está se tornando raro ou, economicamente, extinto em antigas regiões madeireiras.

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Além disso, fronteiras florestais estão sendo abertas para atender a demanda crescente de ipês, com a maior parte da exploração madeireira ocorrendo, agora, na remota região central e sudoeste da Amazônia, onde o acesso e a infraestrutura são pobres, reduzindo o alcance dos agentes de fiscalização.

Segundo o Greenpeace, a colheita do ipê, em florestas remotas, é frequentemente a primeira ação que leva à colheita adicional de espécies de menor valor causando degradação florestal e desmatamento.

Apesar da destruição associada ao comércio, mais de 85% da demanda por ipê, predominantemente utilizado em decks e pisos externos, vem dos Estados Unidos (EUA), Canadá e mercados europeus - todos os países que estão empenhados em combater o comércio de madeira ilegal e insustentável.

Ainda de acordo com o Greenpeace, os produtos processados com ipê, como o decking, podem chegar a mais de US$ 2.500/m3 a US$ 4.000/m3 e nos mercados internacionais. “Além das preocupações com a sustentabilidade da espécie, tem havido extensos relatos de corte ilegal envolvendo o ipê e outras espécies de alto valor em toda a Bacia Amazônica. Como observado, os principais mercados consumidores do ipê têm implementado regulamentos de importação de madeira, proibindo o comércio de madeira extraída, ilegalmente, por mais de uma década. E muitos governos, nessas jurisdições, também priorizaram a proteção da Bacia Amazônica à luz da crescente perda florestal e dos impactos climáticos consequentes nos últimos anos. As populações de ipê são, em última instância, ameaçadas pela escala do desmatamento legal e ilegal na Bacia Amazônica”.

Os regulamentos de importação de madeira, tais como o European Union Timber Regulation (EUTR), o United Kingdom (UK) Timber Regulation, e o US Lacey Act, não conseguiram lidar com a escala da crescente demanda por ipê e o comércio insustentável resultante de certas espécies tropicais.

Com o aumento da demanda e a extração insustentável, há oportunidades para aumentar as proteções nacionais para o ipê e aumentar a capacidade de fiscalização na Bacia Amazônica para combater a fraude e a corrupção que facilita a lavagem de madeira ilegal nas cadeias de abastecimento. Como parte desta abordagem, é fundamental que os governos da região estejam comprometidos com a proteção ambiental e invistam na coleta de dados sobre populações de espécies e composições, por inventários florestais nacionais, bem como na implementação de sistemas robustos de rastreamento ou rastreabilidade da madeira para promover a transparência nas cadeias de fornecimento de madeira.

As exportações de ipê aumentaram 24% entre 2017 e 2019. Já as exportações regionais do ipê, em 2021, parecem ter diminuído, em grande parte impulsionadas por uma redução das exportações do Brasil.

Manejo sustentável ou catalisador da degradação florestal?

Essa é uma questão levantada pelo Instituto Floresta Tropical, uma OSCIP, com foco em questões florestais, a respeito do uso dos ipês em um dos artigos científicos publicados em agosto de 2008 na revista científica “Biological Conservation”, onde o uso da madeira é questionado.

“Nos últimos anos, as colheitas de ipê diminuíram ou cessaram, na maioria das antigas fronteiras madeireiras, no leste da Amazônia, enquanto se espalhavam para novas fronteiras madeireiras no centro e sudoeste da Amazônia. Com os preços atuais do mercado de madeira, infraestrutura de transporte e custos de colheita, a extração de ipê seria lucrativa em cerca de 63% da Amazônia brasileira; nas fronteiras madeireiras mais remotas, apenas a extração de ipê e algumas outras madeiras de alto valor é, atualmente, lucrativa”, revela o estudo.

Com isso, conclui-se que as populações de ipê, no leste da Amazônia, está ameaçada pela atividade madeireira e merece proteção adicional sob a legislação florestal.

Faremos do ipê o novo mogno?

Em geral, aproximadamente, 77% das exportações de ipê foram classificadas como pisos ou decks, com 19% exportados como madeira serrada. Cerca de 4% do ipê rastreado foi exportado sob outras categorias de produtos ou códigos HS, incluindo carpintaria, aglomerado de partículas, folheados e compensados. O Paraguai foi o único país onde mais ipê foi exportado como madeira serrada do que como piso.

O balanço mostra que 96% (451 mil metros cúbicos de 470 mil) dos ipês exportados da Pan-Amazônia, entre 2017 e 2021, vieram do Brasil. Nesses 5 anos, as vendas cresceram 76% em relação ao período 2010–2016. Os maiores compradores foram Europa, Estados Unidos e Canadá, seguidos por Israel, China, Coreia do Sul, Japão e Índia.

As variadas espécies de ipês têm madeiras belas, duras e resistentes à chuva e ao sol. Quase todas estão no Brasil, com parentes na Bolívia, Peru, Equador e Paraguai, onde é chamado “lapacho”. Os ipês amarelo e roxo, da Amazônia brasileira, são listados como ameaçados de extinção pela União Internacional Para Conservação da Natureza.

Como resolver esse problema?

A Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites) é um acordo ambiental multilateral com 184 países membros. Seu objetivo é assegurar que o comércio internacional de espécies de animais e plantas selvagens não ameace sua sobrevivência.

Embora a Cites seja legalmente vinculativa para os países membros ou “Partes”, ela não substitui as leis nacionais. Em vez disso, fornece uma estrutura a ser respeitada por cada Parte, que deve adotar sua própria legislação (doméstica) para assegurar que a Cites seja implementada em nível nacional.

As partes da convenção monitoram e controlam o comércio relevante, exigindo que todas as importações, exportações e reexportações de espécimes de espécies cobertas pela convenção sejam autorizadas através de um sistema de licenciamento global.

As Partes devem registrar todo o comércio das espécies listadas e relatá-lo, anualmente, ao secretariado da Cites. Esta informação é tornada pública através do banco de dados comercial online gerenciado pelo Centro de Monitoramento da Conservação Mundial do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP WCMC). Além disso, as partes devem designar pelo menos uma autoridade administrativa responsável pelo licenciamento e pelo menos uma autoridade científica responsável pela avaliação dos efeitos do comércio proposto e real sobre o status das espécies. 

O Forest Trends e o Center for International and Environmental Law (CIEL) produziram um manual para apoiar as Partes a fazer descobertas legais de aquisições. Além disso, emendas a outra resolução sobre Conformidade e Execução estabeleceram recomendações para que as Partes importadoras examinassem a legalidade das importações em vez de confiar em documentos como prova de fato de legalidade.

O Forest Trends recomenda “que todas as espécies de madeira comercializadas como ipê sejam listadas na Convenção sobre o Comércio de Espécies Ameaçadas de Extinção (CITES) que se destina a garantir que o comércio de espécies selvagens da fauna e da flora sejam tanto sustentável quanto legalmente adquirido”.

Junto a isso, comprometimento governamental com a proteção ambiental por inventários e coletas de dados sobre as populações de espécies e implementação de sistemas robustos de rastreamento da madeira para promover a transparência na cadeia de fornecimento foram também cobrados. 

“Finalmente, recomendamos que os governos, bem como a Organização Mundial de Aduanas, que administra o Sistema Harmonizado de Descrição e Codificação de Mercadorias, alterem os códigos do Sistema Harmonizado (SH) utilizados para classificar os produtos comercializados para aumentar os dados de exportação e importação de produtos madeireiros específicos de espécies. A identificação das espécies de madeira, no comércio internacional, é de vital importância para os esforços de captura e rastreamento do volume de certas espécies. Isto pode ajudar a conservar a biodiversidade das espécies e lidar com o rastreamento da madeira”, finaliza.

Leia o relatório na íntegra:

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