Borba Gato: da descoberta do ouro ao genocídio indígena

Borba Gato foi visto como herói pelos paulistas. (CNN Brasil)

Déborah Arruda – Da Cenarium

MANAUS (AM) – Bandeirante reconhecido e homenageado por ter descoberto grandes minas de ouro em São Paulo, onde hoje é a região de Minas Gerais, Manuel Borba Gato é visto como herói por muitos paulistas. Porém, seu passado é controverso e marcado por uma realidade de muita violência. Os bandeirantes eram responsáveis por capturar e escravizar indígenas, além de destruir os quilombos, nos sertões brasileiros.

O historiador amazonense Rafael Oliveira explicou que, naquela época, eram realizados dois tipos de bandeirantismo: bandeiras de apresamento e sertanismo de contrato. Na primeira metade do século XVII, as bandeiras de apresamento eram intensas, porque a chegada dos holandeses no litoral nordestino dificultou o tráfico negreiro, fazendo com que os indígenas se tornassem uma alternativa. Muitos indígenas foram mortos durante esse processo de escravidão.

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“Ele [Borba Gato] está inserido em um contexto das chamadas bandeiras de apresamento e sertanismo de contrato. A diferença é que a bandeira de apresamento era um tipo de bandeirante que entrava no sertão em busca de capturar e escravizar indígenas. E o sertanismo de contrato refere-se à entrada no sertão a fim de descobrir e destruir os quilombos, onde estavam os escravos fugidos. Ele se insere nesse contexto, juntamente com Domingos Jorge Velho, responsável por destruir o Quilombo dos Palmares. O bandeirante, independente de quem for, é o ícone do herói paulista”, disse o historiador.

A busca pelo ouro

Borba Gato foi reconhecido por ter dado origem ao ciclo do ouro no Brasil. Naquele período, um dos pontos defendidos pelos bandeirantes era a livre busca por metais e pedras preciosas, tanto que ele também participou da expedição com Fernão Dias, em busca de esmeraldas. Segundo o historiador Cleomar Lima, naquela época, a Coroa Portuguesa buscava uma alternativa para a crise e as dívidas que se acumulavam. Neste período, a economia não tinha uma exportação forte e era voltada ao comércio local, como feijão e mandioca.

Busca por metais preciosos era uma atividade comum dos bandeirantes. (Reprodução)

“No final do século XVII começaram os rumores de que ele havia encontrado ouro no interior de São Paulo, naquela época não existia Minas Gerais. O governo português vivia uma crise muito séria, eram dívidas e mais dívidas. Eles queriam que tivesse uma nova atividade econômica que viesse suprir a necessidade do absolutismo português. Realmente, Borba Gato foi quem descobriu o ouro no Brasil”, explicou.

Antes de divulgar o conhecimento das minas de ouro, Borba Gato foi confrontado por Rodrigo de Castelo Branco, funcionário da Coroa Portuguesa. Naquele momento, após um desentendimento, o bandeirante assassina Castelo Branco e passa a viver em fuga. Após anistia, passou a ser funcionário do governo português.

“Um funcionário da coroa portuguesa chamado de ‘intendente das minas’ começou a pressionar Borba Gato para que ele contasse onde estavam as minas. Borba Gato acabou assassinando esse funcionário. Para fugir da Justiça, da punição, Borba Gato foge para a região central de Minas Gerais e passou a viver escondido, cerca de 15 anos, em uma aldeia de índios, sem uma viva alma branca. Foi nessa época que ele descobriu o ouro, as minas de ouro. Veio um outro intendente, um corrupto, que acaba perdoando o Borba Gato, que virou funcionário do governo português, posteriormente”, destacou o historiador.

Protestos contra homenagens

Com a reviravolta, Borba Gato passou a ser exaltado pelos paulistas e, em 1963, teve uma estátua construída em sua homenagem, na região de Santo Amaro, em São Paulo. A estátua foi alvo de diversas críticas e protestos nos últimos anos. No ano passado, manifestantes jogaram tinta no monumento. E, neste sábado, 24, um grupo ateou fogo no local.

Estátua de Borba Gato incendiada em SP. (Gabriel Schlickmann)

A homenagem ao bandeirante é reflexo da influência dos mais favorecidos por seu trabalho: a elite, conforme afirmou o historiador Aguinaldo Figueiredo. “É uma homenagem patrocinada pela elite que se beneficiou dessas violências, da exploração descomedida, do abuso de status de poder, da naturalização da crueldade e da indiferença com os mais vulneráveis”, explicou.

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