Brasil deixa aliança antiaborto; documento defendia conceito de família baseado em casais heterossexuais

O Brasil havia aderido ao documento, em outubro de 2020, numa cerimônia na qual o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi representado pelos então ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) (Reprodução)
Da Revista Cenarium*

BRASÍLIA – O governo recém-empossado do presidente Lula (PT) anunciou nesta terça-feira, 17, que se retirou da chamada Declaração do Consenso de Genebra, espécie de libelo multilateral contra o aborto e em defesa da família baseada em casais heterossexuais.

A justificativa, expressa em nota conjunta das pastas de Relações Exteriores, Mulheres, Direitos Humanos e Cidadania e Saúde, é de que o texto “contém entendimento limitativo dos direitos sexuais e reprodutivos e do conceito de família e pode comprometer a plena implementação da lei nacional sobre a matéria”.

Ato contra a juíza Joana Ribeiro Zimmer, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em frente ao Ministério Público Federal, em São Paulo; magistrada tentou impedir uma menina de 11 anos de realizar aborto legal após ser estuprada (Bruno Santos/23.jun.22/Folhapress)

O Brasil havia aderido ao documento, em outubro de 2020, numa cerimônia na qual o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi representado pelos então ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), expoentes da chamada ala ideológica da gestão.

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A declaração defende que “a família é a unidade natural e fundamental da sociedade”, em que a mulher “desempenha um papel crítico”, e que “o aborto jamais deve ser usado para fins de planejamento familiar”.

Ministra das Mulheres, Cida Gonçalves afirmou que a saída do consenso representa “uma mudança radical” no campo das políticas que visam a população feminina. Já Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, pontuou que a decisão representa uma aproximação do Brasil com entidades que “de fato […] têm uma tradição na criação de um ambiente político em que o diálogo e o respeito às minorias seja a tônica”.

Os EUA, à época, comandado por Donald Trump, foram um dos patrocinadores da declaração, em 2020. Na posse de Joe Biden, porém, já haviam deixado de referendar o texto e de representar sua liderança.

Após a saída do Brasil, teriam restado apenas três signatários latino-americanos no documento: Haiti, Guatemala e Paraguai — a última versão oficial do documento é de outubro de 2021. Trata-se de uma consequência da nova “onda rosa” na região, após a eleição de vários líderes de esquerda e de centro-esquerda. Em agosto passado, Gustavo Petro, presidente da Colômbia, então, recém-empossado, deixou o acordo assinado por seu antecessor direitista Iván Duque, meses antes.

A declaração defende que ‘a família é a unidade natural e fundamental da sociedade’, em que a mulher ‘desempenha um papel crítico’, e que ‘o aborto jamais deve ser usado para fins de planejamento familiar’ (Gilberto Soares/Futura Press)

A decisão do Brasil ocorre um dia após o Ministério da Saúde revogar seis portarias da gestão Bolsonaro. Uma delas previa a necessidade de que o médico avisasse a polícia em caso de aborto por estupro.

Ainda nesta terça, o governo federal também comunicou à Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) a intenção de se associar a duas outras declarações que tratam da questão de gênero.

São elas, o Compromisso de Santiago e a Declaração do Panamá, que analisam o tema sob a perspectiva dos impactos da Covid-19 e da desigualdade social, respectivamente — ao contrário da Declaração do Consenso de Genebra, elas estariam “plenamente alinhadas com a legislação brasileira”.

Segundo a gestão petista, a associação aumentaria o potencial para cooperação multilateral sobre direitos das mulheres nos âmbitos regionais e do hemisfério.

(*) Com informações da Folhapress
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