Crônicas do Cotidiano: o humor político e o Carnaval

É bom não confundir as Joias da Coroa com as Joias da Imperatriz. As primeiras são objetos especiais para o uso do Imperador em ocasiões cerimoniais, compostas de joias e trajes, também conhecidos como “regalias”, que significa, neste caso, “coisas do rei” e que pertencem ao Estado Brasileiro. Por incrível que pareça, grande parte está guardada ou exposta no Museu Imperial, em Petrópolis: a Coroa, o Cetro Imperial, o Traje Imperial, A Mão da Justiça (molde da Mão Direita do Imperador) e outros de valor simbólico como a murça do traje majestático e a Pena de Ouro da Abolição; outras foram furtadas pelos novos palacianos, quando da proclamação da república. Já a segunda, conhecida como “a caixa de Joias”, avaliadas em cerca de mais de cem milhões de reais, em dinheiro de hoje, eram de propriedade da Imperatriz Teresa Cristina, de seu patrimônio pessoal; muitas outras, resultado de herança, algumas adquiridas por compra ou presentes dados à Imperatriz Consorte pelos “amigos do Imperador”, mas sob a guarda dos servidores do Império. É essa caixa, ou melhor, “O furto da caixa de Joias da Imperatriz”, que se tornou o maior qui pro quo do final do Império Brasileiro, ocorrido entre o dia 17 e 18 de março de 1882. Depois das comemorações do aniversário da Imperatriz, no Paço Imperial, a família subiu para Petrópolis e as joias ficaram sobre a guarda do Camareiro. Sumiram! Depois de muita confusão e cobranças da imprensa, foram achadas, dentro de latas, enterradas no fundo de um quintal; os autores do furto foram presos, condenados e, depois, anistiados por Dom Pedro II. O Mordomo, responsável pela guarda das joias foi perdoado e condecorado, pois além de responsável pela guarda das joias da coroa e das joias da imperatriz, guardava, também, todos os segredos da Família Imperial, sobretudo, os relacionados às safadezas do Imperador com suas amantes, apesar de parecer muito discreto.

Vejam só, o negócio com joias e governantes, no Brasil, vem de longa data e essa confusão entre joias que são presentes, joias que são “personalíssimas” dadas como presente ao mandatário e as que são do Estado daria um belo enredo de Escola de Samba, se não deu, em algum lugar: Ala do furto das joias da Imperatriz; Ala dos saqueadores das joias do Estado, com a proclamação da República; Ala das joias do “Ouro para o bem do Brasil”; Ala do “Ouro dos Pastores do MEC”; Ala dos “Brilhantes das Arábias”; Ala do “Ouro de Tolo”. E já pensou, no Abre Alas, o Marquês de Barbacena com o Decreto Real da Derrama e garimpeiros irregulares saindo de um baú para esconder-se nas arquibancadas do Sambódromo? No último carro alegórico, a “Velha Política” com a “pepita de ouro do garimpo do partido”. Para uma Escola de Segunda Grupo, que se esmerou nos adereços e na harmonia, seria injusto não dar a ela o acesso ao Grupo Principal!

Mas não! Quase todas as Escolas de Samba mergulharam no identitarismo afro-brasileiro, abrindo os carros e alas para as personalidades empoderadas e gabaritadas para mostrar que o Brasil Preto, sem aspas, se levanta das senzalas modernas, espalhando na avenida seus Orixás, suas cosmogonias, mitos e lendas, para dizer que os negros não são carne exposta ao escárnio, repasto do racismo da “branquelice”, que nunca existiu, mas assumida por espertos como casta, por isso é falsa, além de cruel e desumana. Assombra os preconceituosos e os poderosos, mas aplaca a ignorância e educa os que precisam aprender a se autoconhecer.

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A “Vai-Vai”, dona de quinze títulos de Campeã do Carnaval de S.Paulo, enveredou por outro caminho da crítica social, envolvendo-se numa batalha político-cultural com a extrema direita paulista, que a acusa de afrontar a “Briosa Polícia Militar”, dando nome aos bois e desfilar com uma ala nominada de “Sobrevivendo no Inferno”, homenagem ao álbum musical da década de 90, do século passado, dos “Racionais MC’s”, mas que o Sindicato de Policiais e políticos acham-se representados no título da Ala e nos passistas fantasiados de “demônios”, com direito a chifre e tudo, além da palavra “CHOQUE”, escrita no escudo, que serve de adereço da fantasia. Será?!

(*) Walmir de Albuquerque Barbosa é jornalista profissional, graduado pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo e professor emérito da Ufam.
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(*)Jornalista Profissional, graduado pela Universidade do Amazonas; Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo; Professor Emérito da Universidade Federal do Amazonas.

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