Democratas preparam acusação de ‘incitação à insurreição’ para pedir impeachment de Trump

Presidente da Câmara, Nancy Pelosi, em entrevista coletiva no Capitólio (Erin Scott/Reuters)

Com informações do O Globo

WASHINGTON — A presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, a democrata Nancy Pelosi, revelou ter conversado com lideranças das Forças Armadas para impedir que Donald Trump, chamado por ela de um “presidente desequilibrado”, lance operações militares em seus últimos 12 dias de mandato, especialmente um ataque nuclear.

 Em carta aos deputados, a democrata também reiterou que, se Trump não renunciar “imediatamente”,  vai abrir um novo processo de impeachment contra ele por ter instigado a invasão do Congresso, na última quarta-feira, para impedir a certificação da vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais, em ato que ela chamou de “ataque terrível à democracia” americana.  Especula-se que os procedimentos de impeachment seriam abertos na Câmara na segunda-feira, e já ha um rascunho da acusação, que seria de “incitação à insurreição” contra a ordem constitucional do país.

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Pelosi disse ter conversado com o chefe do Estado Maior, Mark Miley, e discutido maneiras de impedir que Trump acesse os códigos e procedimentos para o lançamento de um ataque nuclear — um ato que é prerrogativa exclusiva do presidente.

“A situação desse presidente desequilibrado não poderia ser mais perigosa. Precisamos fazer o possível para proteger o povo americano deste ataque ao nosso país e à nossa democracia”, escreveu a deputada.

Nos últimos anos, em meio ao desenvolvimento do programa nuclear norte-coreano, deu-se início a um debate acirrado sobre o tema do acesso aos códigos nucleares americanos, mas não houve mudanças nos protocolos atuais. Hoje, o arsenal americano possui cerca de 4 mil ogivas, sendo que mil delas prontas para uso.

A presidente da Câmara instou os republicanos, que atualmente controlam o Senado, a se juntarem às iniciativas para que Trump seja afastado da Casa Branca antes do fim do seu mandato, seja pelo impeachment, seja por meio do recurso à emenda 25 da Constituição, pela qual ele seria declarado incapaz de governar pelo vice-presidente, Mike Pence, e a maioria do seu Gabinete.

“Há cerca de 50 anos, depois de anos de apoio ao seu presidente desonesto, os republicanos no Congresso decidiram que era hora de Nixon ir embora. Hoje, depois dos atos perigosos e sediciosos do presidente, os republicanos no Congresso têm que seguir o exemplo e exigir que Trump deixe o cargo — imediatamente. Se o presidente não renunciar imediatamente e por bem, o Congresso vai dar continuidade à ação”, disse ela na carta.

O presidente eleito, Joe Biden, disse que a decisão sobre um eventual impeachment “é do Congresso” e declarou que sua prioridade agora é o combate ao novo coronavírus, sem revelar se apoia ou não o afastamento de Trump, embora considere o atual presidente como “incapaz” para o cargo.

Segundo pesquisa divulgada nesta sexta-feira, 57% dos americanos defendem a saída de Donald Trump da Presidência. Os números da Reuters, em parceria com o instituto Ipsos, apontam ainda que 70% dos eleitores do republicano reprovam a invasão do Capitólio, e que 68% rejeitam a maneira como Trump agiu no episódio.

Acusação em preparação

Declarações de deputados democratas sugerem que o início do processo de impeachment pode ocorrer na segunda-feira. O maior desafio é o prazo: são apenas 12 dias para realizar um processo que normalmente leva meses até ser concluído, incluindo uma série de votações nas duas Casas do Congresso.

Nesta sexta-feira, a NBC News divulgou um rascunho do texto que deve dar início ao processo de impeachment. O rascunho aponta que Trump deve ser acusado de “incitação à insurreição”, relacionado ao seu comportamento e declarações antes e durante a invasão do Capitólio. No documento, Trump é apontado como o responsável por palavras que incentivaram o que chamaram de “atos violentos, mortais, destrutivos e sediciosos”.

“O presidente gravemente colocou em risco a segurança dos EUA e as instituições de governo. Ele ameaçou a integridade de nosso sistema democrático, interferiu na transição de poder e colocou em perigo um dos Poderes constituídos”, diz o texto. “Dessa forma, o presidente Trump demonstrou que continuará sendo uma ameaça à segurança nacional, à democracia e à Constituição se permanecer no cargo.

O texto ainda menciona o telefonema ao secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger, no sábado passado, quando pediu a ele que alterasse os resultados da votação no estado a seu favor.

Diante da ameaça cada vez maior contra Trump, a Casa Branca recuperou parte do trecho do discurso do presidente na noite de quinta-feira, e disse, em comunicado, que um processo do tipo iria “dividir” o  país. “Como o presidente Trump disse ontem, é um momento de cura e união de uma só nação. Um impeachment com motivações políticas contra um presidente que só tem 12 dias no cargo só servirá para dividir ainda mais nosso grande país”, declara o texto.

Processo rápido?

Para ser aprovado o afastamento, o que jamais ocorreu na História americana, os artigos do impeachment, que equivalem a acusações formais, precisam de maioria simples na Câmara e dois terços do Senado. Caso seja aprovado o processo, Trump será o primeiro chefe de Estado dos EUA a ser julgado duas vezes pelo Congresso — em janeiro do ano passado, ele foi absolvido no Senado da acusação de abuso de poder, no caso em que tentou convencer o governo da Geórgia de encontrar informações contra Biden.

Segundo o Washington Post, pelo menos 131 deputados democratas defendem a abertura dos procedimentos, mas ainda não há unanimidade na sigla. Adam Schiff, que comandou o inquérito sobre Trump em 2019, avalia que um processo acelerado pode soar “abertamente político”. Steny Hoyer, líder da maioria na Câmara, prefere a adoção da 25ª emenda, mas declara que o Congresso “deveria considerar o impeachment”, caso Mike Pence não concorde em agir pelo afastamento.

Também é incerto o apoio dos republicanos: na sessão que confirmou a vitória de Joe Biden na eleição presidencial, 139 republicanos na Câmara e oito no Senado votaram a favor das objeções aos resultados, mesmo depois da invasão ao Congresso. O senador Ben Sasse foi um dos poucos a se pronunciar, dizendo que “consideraria” uma acusação contra o presidente vinda da Câmara, comandada pelos democratas. Em entrevista ao jornal Anchorage Daily News, a senadora Lisa Murkowski pediu a renúncia de Trump, e questinou a própria permanência no Partido Republicano.

“Quero que ele renuncie. Quero ele fora. Ele já causou muito estrago”, declarou a senadora do Alasca. Ela ainda culpou Trump pela invasão do Capitólio.

O senador Lindsey Graham, antigo aliado de Trump que votou contra as objeções, se disse contra o afastamento pela 25ª emenda, mas deixou em aberta sua posição para outras saídas:

“Não acredito que isso (afastamento pela 25ª emenda) seja apropriado neste momento” declarou. “Agora, se algo mais acontecer, todas as opções estarão sobre a mesa.”

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