Desconstrução dos padrões: tese defende que interesses econômicos e políticos estão por trás de discursos favoráveis à beleza

Na foto, mulheres entrevistadas para a edição da Revista Cenarium no mês de março (Foto: Ricardo Oliveiras/Cenarium)

Paula Littaiff – Da Revista Cenarium

MANAUS (AM) – No mês em que se comemora o Dia da Mulher, a REVISTA CENARIUM coloca em debate “modelos” de beleza criados pela sociedade desde a Idade Antiga (4.000 a.C a 476 d.C) que aprisionam e sufocam as mulheres, mas que passaram a ser questionados a partir da ideia de que o conceito de “belo” se confronta com variantes e pode envolver fatores ocultos.

Uma tese levantada pela professora da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) Verônica Pacheco Azeredo, em seu estudo sobre a identidade do corpo humano – com base na obra “Genealogia da Moral” (1886), do filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900) -, defende que por trás de um discurso favorável à beleza estão interesses econômicos e políticos, e o desejo de chegar a um padrão inalcançável.

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A análise de Verônica Azeredo está entre tantas pesquisas de estudiosos contemporâneos que desconstroem a dualidade do “feio e bonito”, e colocam em debate convenções sociais que foram criadas e alimentadas desde Platão (428 a 347 a.C), com a famosa “Teoria do Belo” e com os ideais de “bem” e “mal”.

Verônica Azeredo aponta que pela interpretação de Nietzsche, as avaliações dualistas possuíam interesses religiosos e morais, além de contribuírem para a negação do corpo. Para o filósofo, também não havia a divisão entre corpo e alma, eles são indissociáveis, e a alimentação de um ser não visto poderia gerar princípios abstratos.

“Analisou-se o conceito de corpo na contemporaneidade com o intuito de demonstrar que, embora exista um apelo pelo belo, esse corpo é tratado como coisa, como mercadoria. No culto ao corpo, revelam-se ideologias políticas, econômicas e éticas”, explica a professora de Filosofia.

Na pesquisa de Verônica, a estudiosa conclui que a estética e a ética não são desvinculadas da sociedade e, em cada época, a cultura educa os corpos, adaptando-os para empregos distintos, ferindo até princípios humanos. “Inferimos que o corpo do homem contemporâneo recebe um tratamento ambíguo, pois é valorizado e mostrado, mas termina por ser explorado, violentado e banalizado, aponta Verônica, em sua tese.

Indústria bilionária

Apesar dos desafios enfrentados pela pandemia, a indústria brasileira de estética exportou R$ 1,7 bilhão no acumulado do ano, até junho de 2021, correspondendo a uma alta de 16% em relação ao mesmo período do ano anterior.

As informações são da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). A mesma instituição divulgou que as empresas que realizam procedimentos estéticos, incluindo cirurgias plásticas, crescem, em média, 5% a cada ano, e o faturamento do segmento ultrapassa R$ 160 bilhões, anualmente.

Manter uma boa relação com o espelho é o que motiva os brasileiros a procurarem recursos estéticos, mas o que se busca nessa projeção é um ideal criado por quem quer faturar, a todo custo, usando a vulnerabilidade de quem busca uma beleza abstrata.

Voltando a Friedrich Nietzsche, na visão do filósofo, a busca pelo belo é mais um desejo do ser humano em atender a um padrão social intangível, uma espécie de fuga angustiante. “É a fuga de uma dor”, como apontou a professora Verônica Azeredo em seus estudos.

Mesmo controverso no pensamento sobre as mulheres – assim como a maioria dos homens de sua época, questionamentos de Nietzsche relacionados ao corpo são importantes para que a sociedade, principalmente o público feminino, coloque em xeque os modelos dualistas criados pela indústria e passe a entender que o belo é ser único.

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