‘Ele sofreu ataques e boicotes’, diz ex-aluno sobre o médico que levou o internato de medicina para o interior do AM

Menabarreto criou uma alternativa técnica para tirar os estudantes de medicina 'dos muros da Ufam' e levá-los ao interior do Amazonas (Thiago Alencar/CENARIUM)
Mencius Melo – Da Revista Cenarium

MANAUS – O médico aposentado Menabarreto Segadilha França, que morreu no último domingo, 25, por complicações de saúde provocadas por um câncer, continua recebendo homenagens e reconhecimento de ex-alunos, entidades e colegas de trabalho. “Ele foi ameaçado por pais de alunos. Ele sofreu ataques e boicotes por parte de alunos que não aceitavam ir para o interior”, comentou Nicolás Heufemann, ex-aluno, amigo e admirador do médico pioneiro.

O professor Menabarreto Segadilha com alunos, em aula de campo, sobre saúde coletiva, no início dos anos 1990 (Reprodução/Arquivo Pessoal)

Menabarreto foi professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), onde ingressou no ano de 1976. Como diretor da faculdade, fundou, em 1987, o Internato Rural de Medicina da Ufam. O projeto teve início nas agrovilas de Mocambo e Caburi, no interior de Parintins. A ideia central era levar estudantes de medicina, de Manaus, para um estágio humano no interior da Amazônia. De acordo com Nicolás, o contato era para que “os futuros médicos entendessem e compreendessem a realidade do mundo que os cercava”.

À CENARIUM, Heufemann falou sobre a admiração pelo “polêmico e visionário”, segundo ele, Menabarreto Segadilha. “Ele foi um visionário na década de 1980. Ele nos contava a resistência tremenda para criar o Internato Rural. Se, hoje, em 2022 é difícil encontrar médicos no interior do Amazonas, imagine nos anos 1980. Ele foi corajoso e visionário e demorou muito para que todos entendessem o quanto era importante esse processo de interiorização provocado pelo Menabarreto”, declarou Nicolás Heufemann.

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Passos

De acordo com Nicolás, que foi aluno de Menabarreto, a influência do mestre foi tanta que ele, hoje, segue os passos do professor. “A sociedade demorou a perceber a enorme contribuição e o pioneirismo de Menabarreto e, hoje, ele é um marco no ensino da medicina, no Amazonas, e eu sigo esses passos porque eu coordeno o Internato Rural da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), e lembro que ele nos elogiava porque conseguimos dar um passo além da Ufam, já que conseguimos unificar medicina, odontologia e enfermagem no nosso internato”, explicou.

O médico Menabarreto Segadilha, a médica Heliana Feijó, e o também médico Jacob Cohen na companhia de um assessor parlamentar do deputado Sinésio Campos (Reprodução/Arquivo Pessoal)

A face humana e social de Menabarreto, segundo o ex-aluno, era a sua política existencial. “O Mena foi uma figura marcante. O ‘fazer médico’ dele me moldou. Ele ouvia as pessoas e falava a língua delas, e não aplicava além da bula do remédio. Ele era o ‘componente social do médico’, tão especial na minha formação profissional. De um fazer médico mais implicado com a vida das pessoas. Ele era além da prescrição médica. Eu levo isso para a minha vida”, agradeceu Heufeman.

Outra paixão de Menabarreto era o Sistema Único de Saúde (SUS). “Mena era um defensor incondicional do Sistema Único de Saúde, o SUS. Ele brigava, ele lia, ele interpretava, ele discutia. Ele ia para as plenárias dos conselhos de saúde, para conferências nacionais de saúde. Ele foi um militante do SUS. Ele se fez exemplo para estudantes de graduação, com esse perfil de defesa do SUS. Essa defesa era no conhecimento das leis e nas reflexões acerca do cuidado com a comunidade. Onde ele transitava, ele levava a bandeira do SUS”, relembrou Nicolás.

Admiradora

A médica Heliana Feijó acompanhou Menabarreto em sua luta e lamentou a partida. “Hoje, a saúde coletiva, a medicina, o Internato Rural e o SUS, no Amazonas, estão de luto pela perda de um dos seus mais intransigentes defensores. Menabarreto Segadilha França concluiu sua carreira neste plano e passou para a imortalidade nas memórias de quem o compreendeu e respeitou. O guerreiro descansou”, pranteou a profissional.

Heliana Feijó ao lado de Menabarreto Segadilha. Amigos de uma vida e de luta pela prática da medicina humanizada na Amazônia (Reprodução/Arquivo Pessoal)

Assim como o ex-aluno Nicolás, que admira o professor Menabarreto, Heliana também enaltece o “caráter combativo e humano” do amigo que partiu. “Sua marca registrada era o bem coletivo. Sua luta sempre foi a defesa do SUS, da educação de qualidade, do meio ambiente preservado, do controle social e da formação de médicos com competência universal e compromisso social regional. Jamais desistiu de lutar pela saúde da população do interior do Amazonas”, reconheceu. “Ele se tratou na Fcecon e morreu no hospital que ajudou a conquistar para a Ufam: o glorioso Hospital Universitário Getúlio Vargas”, finalizou.

Homenagem

Após o comunicado da morte de Menabarreto, entidades locais e nacionais soltaram notas de solidariedade. Entre elas, a Associação Brasileira de Educação Médica (Abem). A Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), por meio de seu conselho diretor, vem a público prestar suas condolências aos familiares, alunos, amigos e colegas do professor Menabarreto Segadilha França. Defensor ativo do Sistema Único de Saúde (SUS), o mestre em Saúde Pública pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam) faleceu no último domingo, dia 25 de dezembro, aos 75 anos. Será lembrado como um médico e professor incansável na luta em defesa do SUS e dos direitos humanos.

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