Exercendo funções médicas, de logística e combate mulheres representam 22% do Exército ucraniano

Irina Sergueieva, primeira mulher voluntária a ser admitida nas forças de defesa territorial da Ucrânia (Sergei Supinsky/AFP)
Com informações do Estadão

BAKHMUT (UA) – O número de mulheres que atuam no Exército da Ucrânia, principalmente na função de paramédicas na linha de frente, tem aumentado conforme a guerra com a Rússia se prolonga, segundo associações de combatentes locais. As principais funções desempenhadas pelas militares incluem atendimento médico, logística e até mesmo posições de combate.

Os soldados das unidades militares na linha de frente que combatem a ofensiva da Rússia para tomar controle completo da região do Donbas são, predominantemente, do sexo masculino. Mas, quando um homem se fere, é com frequência uma mulher que sai da ambulância para socorrê-lo.

As mulheres representam, atualmente, 22% do Exército ucraniano, um aumento que se iniciou com a guerra financiada pela Rússia, no leste, desde 2014, mas se acentuou desde que a invasão russa em escala total começou quatro meses atrás, de acordo com Katerina Priimak, cofundadora do Movimento das Mulheres Combatentes da Ucrânia.

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“Desde fevereiro, o número de mulheres se alistando não para de crescer”, afirmou ela. Hanna Khurava viu um grande aumento no número de mulheres servindo em unidades, nas linhas de frente, desde que virou paramédica militar em 2016. Naquela época, as mulheres serviam, principalmente, em funções de apoio ou como cozinheiras das unidades. “Agora, vejo mulheres motoristas, mecânicas, paramédicas, artilheiras e comandantes”.

Uma explosão na escuridão

Alina Mikhailova dormia no chão de um armazém vazio, a única mulher entre dezenas de soldados descansando o quanto conseguissem depois de dias consecutivos de combates. Ela despertou com o estrondo de uma explosão, uma ocorrência tão frequente nas linhas de frente, na Ucrânia, que não perturbou a maioria de seus companheiros exaustos.

“Me bateu uma sensação estranha com aquela explosão”, afirmou Mikhailova, que atua como paramédica em uma companhia de assalto do Exército, e ela já vestia o uniforme quando recebeu o chamado: um míssil russo havia atingido a unidade. Mikhailova correu para o local do ataque e encontrou um soldado cobrindo os ferimentos em seu abdome.

Prédio atingido por míssil em Bakhmut, na UcrâniaP)
Prédio atingido por míssil em Bakhmut, na Ucrânia (Genya Savilov/AFP)

Ele foi colocado em uma van Volkswagen Transporter transformada em ambulância para a tortuosa viagem de uma hora até o hospital. “Toda vez que passávamos por algum buraco, ele gemia”, afirmou ela. “Me dei conta de que havia estilhaços se movendo dentro de seu corpo, cortando seus órgãos”.

Semanas depois, ela se recordou que a pressão do paciente estava caindo, acentuadamente, então, ela improvisou um tratamento preenchendo com gaze as feridas abertas, para evitar que o metal afiado se movesse perigosamente e seccionasse órgãos vitais. Em nenhum momento a transformação que ela sofreu na guerra foi mais marcante: da vegetariana que estudava ciências sociais, em Kiev, até a paramédica militar atuando nas linhas de frente.

Do snowboard ao front

“Eu era simplesmente uma garota que gostava de snowboard”, afirmou ela, sentada em sua ambulância em meio a estrondos da artilharia, à espera do próximo chamado — enquanto os números de mortos vão às alturas sob os fulminantes ataques da Rússia ao longo do front oriental. “Mas decidi que aqui é onde tenho de estar”.

Poucas semanas depois dos tanques russos atravessarem as fronteiras, Khurava se casou com o soldado que dirige sua ambulância. “Bom plano de lua de mel, não?”, perguntou ela, com o olhar nos sacos de areia barricados diante do hospital de Kramatorsk para onde ela leva a maioria dos mortos.

Tanque ucraniano durante confronto com o Exército russo na cidade de Bakhmut, em Donetsk (Tyler Hicks/NYT)

Seu novo marido tentou dissuadi-la de juntar-se ao esforço na linha de frente, dizendo-lhe que era a vez dele correr o risco, que ela deveria ficar segura. Khurava respondeu que nada havia mudado depois da troca de alianças.

“Eu disse a ele, ‘Se você for estar no primeiro ônibus para sair daqui, então estarei no segundo”, afirmou ela.

Um casal na frente de combate

O casal cumpria um turno de 24 horas em um vilarejo a oeste da cidade sitiada de Lisichansk. Sua ambulância estava estacionada sob uma árvore, para ser protegida do campo de visão dos drones russos, próximo a um bunker antibombas escavado no solo, coberto por troncos e terra.

Tudo estava calmo até que um sistema Grad da artilharia ucraniana disparou uma bateria de foguetes, fazendo estrondo e fumaça do outro lado de um pasto do vilarejo. O sistema Grad, veículo motorizado lançador de foguetes da era soviética é capaz de disparar até 40 projéteis de 122 milímetros e depois evadir-se com velocidade, antes que os russos sejam capazes de fechar a mira sobre sua localização e responder ao fogo.

Ataque aéreo russo na cidade de Kiev, em 26 de junho (SERGEY DOLZHENKO/EFE)

Segundos após o disparo, uma explosão sibilante se seguiu, e uma grossa coluna de fumaça ascendeu do local de lançamento dos foguetes Grad. E outra. E mais uma.

“Disparamos os Grad, e então os russos contra-atacam”, afirmou Khurava enquanto alcançava seu colete de proteção contra estilhaços.

Evidentemente, 20 minutos depois, um grupo de soldados apareceu berrando pela ambulância. Eles carregavam um colega com um ferimento leve na testa ocasionado por uma das explosões.

“Volte aqui para trocar o curativo”, disse ela ao soldado depois de enfaixar sua cabeça.

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