Jogo eletrônico que estimula escravidão e reforça racismo é retirado do ar pela Google

Tela do jogo virtual no aplicativo (Google Play/Divulgação)
Da Revista Cenarium*

SÃO PAULO – Um jogo eletrônico em que o usuário é um “proprietário de escravizados” estava disponível até o início da tarde desta quarta-feira, 24, na plataforma do Google Play. O jogador é estimulado a obter “lucro” e contratar guardas para evitar rebeliões. Há até uma opção para que o usuário explore, sexualmente, as pessoas colocadas sob seu poder dentro do mundo virtual.

O jogo mostra imagens de pessoas acorrentadas, inclusive, um homem negro, que aparece coberto de grilhões em uma estética semelhante a um desenho animado. Na capa, é usada uma gravura histórica que retrata um homem branco, em roupas elegantes, ao lado de um homem negro, escravizado, seminu.

O Simulador de Escravidão tinha, segundo a própria plataforma, sido baixado mil vezes até a manhã desta quarta. Um desenvolvedor de nome Magnus Games apresenta-se como criador deste e de outros jogos disponíveis no Google Play. Os perfis, nas redes sociais, não permitem identificar com clareza qual seria a empresa ou pessoa por trás do produto.

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Racismo grosseiro

A historiadora e psicanalista Mariléa de Almeida vê “racismo grosseiro” no jogo. “Naturalizando a escravização, a desumanização desses corpos negros, como se brincar e fazer um jogo, como esse, não tivesse efeito sobre as pessoas negras, identificadas na sua ancestralidade, mas, sobretudo, nas pessoas que estão jogando”, enfatizou a pesquisadora, que faz parte da rede de Historiadorxs Negrxs.

Para Mariléa, o produto “reforça os estereótipos, usa de todo o estereótipo racial e da desumanização produzida pelo racismo, para o conjunto da população negra, para fazer um jogo”.

A especialista lembra que o chamado racismo recreativo é uma conduta que foi tornada crime, a partir de lei sancionada em janeiro, que equiparou o crime de injúria racial ao de racismo.

Na avaliação dela, as pessoas ainda sentem que há espaço para esse tipo de conduta, devido à construção histórica de que pessoas negras não são seres humanos iguais aos demais. “Esse crime sustenta, do ponto de vista histórico, a naturalização de corpos negros como sendo desumanizados, objetificados”, enfatiza.

“Essa mentalidade se expressa no próprio psiquismo que valida as pessoas a se engajarem em um jogo desses, sem perceberem o horror. Sem sentirem um horror, um incômodo”, acrescenta Mariléa sobre as razões para que seja possível a criação e o uso desse tipo de produto.

Leia mais: Ubiratã: jogo baseado na mitologia indígena destaca personagens do folclore brasileiro

A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com o Google e aguarda resposta.

Repercussão

Mais cedo, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) publicou em sua conta no Twitter que entrará com representação no Ministério Público (MP), por crime de racismo, pedindo a prisão dos responsáveis.

“A própria existência de algo tão bizarro, à disposição nas plataformas, mostra a URGÊNCIA de regulação do ambiente digital”, disse o parlamentar que é relator do PL das Fake News (PL 2630/220).

Deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), em sua conta no Twitter, disse que entrará com representação no Ministério Público (MP), por crime de racismo, pedindo a prisão dos responsáveis (Orlando Silva/Twitter)
(*) Com informações da Agência Brasil
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