Marco Temporal e Zona Franca de Manaus marcaram debates no Congresso em 2023

Direitos dos povos originários e a segurança jurídica da ZFM estiveram na pauta do Congresso. (Edição: Mateus Moura/Revista Cenarium Amazônia)
Adrisa De Góes – Da Revista Cenarium Amazônia*

MANAUS (AM) – Com os trabalhos finalizados em 22 de dezembro, o Congresso Nacional discutiu, em 2023, temas significativos e com influência direta na Amazônia Legal. Sob embates entre parlamentares governistas e de oposição, as pautas que passaram pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal impactaram as populações das cidades, bem como os povos da floresta.

Um dos temas foi o Marco Temporal de terras indígenas, discutido ao longo do ano e promulgado em 28 de dezembro pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A decisão, que ocorreu depois de o Congresso derrubar os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afeta pelo menos 44,48% da população indígena que vive na Região Norte.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com os partidos políticos Rede e Psol entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF). Na ação, as entidades pedem que a lei seja declarada inconstitucional e suspensa até a finalização do julgamento na Corte.

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Protesto no Congresso Nacional contra o Marco Temporal em Brasília (Brenno Carvalho/Agência O Globo)

“Enquanto a ADI tramita no Supremo Tribunal Federal, nós povos indígenas não podemos sofrer os danos da lei. É por isso que estamos solicitando uma medida cautelar, ou seja, solicitando que a lei seja suspensa durante o processo da ação de inconstitucionalidade”, afirmou o coordenador executivo da Apib, Kleber Karipuna.

Ao longo de 2023, indígenas de todas as partes do País se mobilizaram contra a tese que trata da demarcação de terras. Grupos étnicos marcharam e ocuparam as sedes dos Três Poderes, em Brasília, a fim de garantir a proteção constitucional no Congresso Nacional e Judiciário aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente habitadas por essas populações.

Zona Franca de Manaus

Outro assunto de impacto às populações da região amazônica envolve a Zona Franca de Manaus (ZFM), com a promulgação da Reforma Tributária, que manteve a competitividade do modelo econômico por meio do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI). A princípio, a manutenção seria mantida por um Imposto Seletivo e depois pela Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).

Com isso, os insumos produzidos na Zona Franca vão ter alíquota zero em relação àqueles de outros Estados. A promulgação foi declarada pelo presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco, em 20 de dezembro, durante sessão solene, e instituiu a emenda constitucional 132/2023.

A segurança jurídica da ZFM assegura estabilidade a empresas que investem ou se instalam no polo industrial. Para isso, foi necessário um longo processo de articulação política, da bancada amazonense em Brasília, para que o texto da Reforma Tributária contemplasse os benefícios do modelo econômico do qual dependem cerca de 500 mil pessoas, trabalhadores diretos e indiretos.

Linha de produção de motocicletas em empresa instalada na Zona Franca de Manaus (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium Amazônia)

Para o analista político Ademir Ramos, a bancada federal do Amazonas teve destaque no tema com a relatoria do senador do Estado Eduardo Braga (MDB). Para o especialista, a articulação política foi importante para a garantia da efetividade constitucional da Zona Franca de Manaus.

“Mais importante ainda vai ser agora, a partir da retomada do Congresso para se definir as leis que vão regulamentar a questão da Reforma Tributária. Acho que tudo se voltou nesse momento da Reforma Tributária. Para as garantias constitucionais da Zona Franca de Manaus foi muito importante o papel da bancada, tanto na Câmara Federal quanto no Senado”, avalia Ramos.

Crédito de carbono

O Brasil vai iniciar 2024 com a responsabilidade ambiental de posicionar-se no cenário internacional do mercado de crédito de carbono. O primeiro passo para enfrentar resistências em relação a esse novo ativo, que pode potencializar o Tesouro Nacional, foi dado com a aprovação de um Projeto de Lei (PL) na Câmara dos Deputados no fim deste ano.

A matéria vai ser analisada no Senado e a aposta é que a proposta seja votada ainda no primeiro semestre de 2024, a fim de completar propostas de lei que o Congresso Nacional vem aprovando dentro da chamada “pauta verde”.

O texto aprovado na Câmara reúne uma série de projetos de lei que abordavam o tema e que tramitavam há quase dez anos na Casa Legislativa. Um destes projetos é o do ex-deputado federal Marcelo Ramos (PSD), que usou suas redes sociais para comemorar o avanço do debate.

Brasil tem vantagem competitiva com créditos de carbono (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A edição impressa da REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA, publicada em junho de 2023, mostrou o potencial econômico do mercado de carbono para a população que vive no interior. Também levantou o debate sobre a ausência de legislação para destravar investimentos e alertou sobre uma “pedalada verde” que considera biocombustíveis e hidroelétricas no cálculo da iniciativa.

O mercado de carbono foi criado para forçar as economias a reduzirem as emissões de gases do efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4), que são responsáveis pelo aquecimento da terra e impulsionam a atual crise climática marcada por eventos extremos de calor, chuvas e secas.

Lei de agrotóxicos

Com 14 vetos, em 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o projeto de lei que trata do controle, inspeção e fiscalização de agrotóxicos no Brasil. A proposta, que estava em tramitação desde 1999, estabelece regras a produtos com potencial de prejudicar a saúde humana e animal, bem como o meio ambiente.

Segundo o Planalto, a decisão pelo veto dos dispositivos foi movida “pelo propósito de garantir a adequada integração entre as necessidades produtivas, a tutela da saúde e o equilíbrio ambiental”.

Tipos de frutas produzidas no Brasil (Fernando Frazão/Agência Brasil)

O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Entre 2019 e 2022, foram liberados 2.181 novos registros, o que corresponde a uma média de 545 por ano. Em 2023, o país aprovou 505 novos registros de pesticidas, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A expectativa era de que, com a nova legislação, o número ficasse ainda maior.

Um dos vetos foi relacionado ao dispositivo que retirava do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) atribuições relativas à fiscalização, repassando a atribuição ao Mapa. Segundo o Planalto, se aprovado o texto original, Ibama e Anvisa atuariam apenas em “mera complementação” da atuação do Mapa – que acabaria por conduzir essas questões de forma exclusiva.

Análises

Na análise do cientista político Helso Ribeiro, o País apresentou um crescimento considerável em 2023, sobretudo na área econômica, mas destaca que ainda há o que evoluir na área social, no combate às desigualdades sociais, a fim de diminuir o percentuais de pessoas que vivem à beira da miséria.

“Nós fazemos parte do grupo das 20 maiores economias do mundo, os 20 países mais ricos do mundo, mas a gente tem ainda cerca de, vou jogar por baixo, 15 milhões de miseráveis. Então, eu diria que o grande desafio é esse, acabar com o fosso. A frase não é minha, é do Edmar Bacha, o Brasil é uma Belíndia, um pouco de Bélgica e muito de Índia”, ressalta Ribeiro.

O sociólogo e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Marcelo Seráfico afirma que é preciso criar meios de produzir e assegurar que todos tenham as condições materiais de satisfação de suas necessidades e, ao mesmo tempo, assegurar às gerações futuras a possibilidade de uma vida digna, marcada pela garantia de condições de cidadania.

“Do ponto de vista dos amazônidas ou das pessoas que habitam a Amazônia, me parece que é avanço tudo aquilo que assegura condições de cidadania para a maioria dos habitantes da região. Condições de cidadania, hoje, têm um significado muito particular, que tem a ver não apenas com renda, que normalmente é um critério utilizado para se considerar o que é positivo e negativo”, conclui Seráfico.

(*) Com informações da Agência Brasil

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