Marco Temporal: STF se torna epicentro da disputa entre indígenas e conservadores
Indígenas protestam em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF) (Reprodução/Apib)
Adriã Galvão – Da Revista Cenarium Amazônia
BOA VISTA (RR) – Após o Senado Federal promulgar na quinta-feira, 28, a Lei N° 14.701/2023 que impõe a tese do Marco Temporal para demarcar Terras Indígenas (TIs), a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), os partidos Rede Sustentabilidade (REDE) e Psol (Partido Socialismo e Liberdade) protocolaram no Supremo Tribunal Federal (STF) Ação Direta de Inconstitucionalidade 7582 (ADI). No processo, a Apib pede que a Corte, novamente, declare a lei inconstitucional e suspenda seus efeitos até a conclusão do julgamento.
No mesmo dia, os partidos Progressistas (PP), Republicanos e Partido Liberal (PL) também acionaram o STF pedindo a validação da legislação para garantir a derrubada de vetos presidenciais à lei. Na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC), as siglas argumentam que “os vetos presidenciais revelam apenas discordâncias políticas entre o Congresso e a Presidência da República, uma vez que a própria constituição possibilita a derrubada de vetos”.
No texto, os partidos de direita criticam, ainda, o modelo de solução jurídico-jurisdicional usado pelo STF no julgamento da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) e a resolução da convivência entre comunidades indígenas e produtores rurais em 2009. Segundo as siglas, a alteração de jurisprudência no caso foi abrupta e sem aparente razão específica, o que trouxe grande insegurança jurídica até ser corrigida pelo Congresso.
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“Em cenário de discordância republicana entre poderes, acerca de determinado conteúdo normativo, a última palavra em um regime democrático sempre deve ser do Poder Legislativo, verdadeira Casa da democracia”, defendem os partidos na legenda da ação.
Em entrevista à REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA, o coordenador-executivo da Abip, Kleber Karipuna, destacou que ingressar com uma ADI já era uma das fases pensadas pelo movimento indígena. A liderança chama de segunda fase do julgamento do Marco Temporal as mobilizações articuladas, após a aprovação no Congresso, no mês de dezembro, entre elas, a solicitação de audiência com ministros do Supremo para apresentar o posicionamento dos povos indígenas sobre o tema.
“Nossa meta é iniciar o diálogo com os gabinetes de cada ministro para levar nossas argumentações jurídicas e políticas. Como o STF já declarou a inconstitucionalidade da tese, queremos reforçar esse posicionamento junto aos atores do Judiciário e apresentar outras medidas contidas na lei que ferem gravemente o direito das populações indígenas do Brasil”, destacou Kleber Karipuna.
Além de limitar a demarcação de terras tradicionalmente ocupadas pelos povos originários à data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, a lei permite a contestação das terras já demarcadas, a obrigatoriedade da participação dos Estados e municípios no processo de demarcação de terras, a proibição do redimensionamento da terra demarcada, independente de erros por parte do Estado, a intervenção militar sem necessidade de consulta prévia à comunidade, cooperação entre indígenas e não indígenas para exploração de atividades econômicas, dentre outras medidas.
Ao denominar de “Lei do Genocídio”, o maior representante do movimento indígena no Brasil chamou de crime as medidas impostas na legislação. “Mudar o processo demarcatório já estabelecido no Decreto 1.775 é direcionar o genocídio legislado dos povos indígenas, trazendo a insegurança jurídica para nossos territórios”.
“Além de facilitar a entrada de invasores e gerar o extermínio de povos indígenas isolados, por meio do contato forçado, em nome da soberania e desenvolvimento nacional, é crime porque a lei nos garante o usufruto exclusivo de nossas terras. O que queremos, nada mais é, que o pleno exercício dos direitos dos povos indígenas”, finalizou o coordenador-executivo da Apib.
Tanto a organização indígena quanto os partidos que ingressaram com ação no STF aguardam a tramitação na Corte. A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, também se posicionou contra a promulgação da lei e ressaltou no programa “Bom dia, ministra”, do Canal Gov, que o governo federal também prepara recursos ao STF contra a tese do Marco Temporal.
“Nós temos um Judiciário e um Executivo que já declararam superada essa questão do Marco Temporal. Agora, já há uma articulação do próprio Ministério dos Povos Indígenas para provar a inconstitucionalidade da lei”, completou.
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