Olubajé: Celebração para o Orixá Omulu é data fundamental para o povo de santo em agosto

Ilustração de Linoca Souza para a coluna de Djamila Ribeiro, de 26 de agosto de 2022 (Linoca Souza/Reprodução)
Com informações da FolhaPress

BAHIA – O mês de agosto tem uma data fundamental para o povo de santo: o Olubajé, a festa para o Orixá Omulu, também conhecido como Obaluaiyê, com variações de escrita e pronúncia. A ele pedimos que afaste todas as doenças.

Segundo Tadeu Mourão, filho de Obaluaiyê, “o candomblé, seus mitos e seus ritos vão à contramão dos valores individualistas e segregacionistas tão comuns ao universo cultural do Ocidente. Nossos valores herdados do continente africano e da resiliência dos nossos antepassados negros, frente à violência do sistema escravista, falam sobre uma ética muito particular. Nossos ritos são um modo de vivenciar ou rememorar tais valores. O Olubajé, o rito do banquete de Obaluaiyê, é uma mostra clara desses sentidos moralizantes e civilizatórios da negritude”.

O Olubajé está na grande maioria do calendário das casas de candomblé, quando é oferecido um banquete com iguarias deliciosas da comida do orixá, regadas a azeite de dendê e servidas numa folha de bananeira. Quem recebe a comida de Omulu deve comer tudo e não desperdiçar um único grão. Os grãos nascem da terra, seu lugar de domínio.

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Como afirma o babalorixá Rodney William no texto: “É a doença que nos ensina que saúde é um bem precioso”: “Quando Omolu nos convida para seu banquete sagrado, Ele pede que aceitemos de coração aberto. É a doença que nos ensina que saúde é um bem precioso. Afinal, de que vale todo o dinheiro do mundo se não temos saúde para usufruir? Então, aqueles que rejeitam as comidas do Olubajé, além de faltarem ao respeito com o terreiro e com o babalorixá ou iyalorixá que as oferece, provocam a ira do Orixá”.

Trata-se de uma festa de cura dos males do corpo e dos males sociais. Mourão afirma que “no rito anual do Senhor da enfermidade e da cura, o Olubajé propõe o antídoto à doença social da marginalização, da invisibilidade, da segregação e do esquecimento. A cura se dá pela celebração da nossa existência em comunhão festiva com as diferenças e com o divino. Mulheres, negros, gays, transexuais, indígenas, pessoas em situação de rua, enfim, todos os grupos historicamente marginalizados são os donos da festa!”.

O Olubajé tem uma forma muito própria de se organizar. Segundo pai Rodney de Oxóssi, “é uma festa que só pode ser realizada com o dinheiro que os devotos pedem nas ruas em troca de um punhado de pipocas, sua principal oferenda. Esmolas? Sim! A divindade mais rica do panteão africano, o Senhor das Pérolas, só admite que suas obrigações sejam cumpridas com esse dinheiro”.

“Contam os mais velhos que, nos momentos de grandes epidemias, Omulu abandonava tudo e saía pelo mundo curando os doentes. Por isso, também o chamam de ‘o médico dos pobres'”.

Para organizar sua festa, muitas casas aderem a essa tradição de arrecadação do dinheiro necessário para realizá-la. E, assim, o povo de santo vai às ruas vestido de branco, em comunidade, no rito que pode durar até 21 dias.

Trata-se do Sabejé, o cortejo da festa de Omulu! Além de um ato religioso, trata-se de um ato político da mais alta importância. Na comunidade na qual me integro, o Ilê Obá Ketu Axé Omi Nlá, liderada por pai Rodney, a ida às ruas para pedir dinheiro para o Olubajé ocorreu nos três primeiros domingos do mês, na Avenida Paulista, um dos centros financeiros do País.

O ponto de encontro era no cruzamento da Avenida Paulista com a rua Augusta, uma das mais movimentadas encruzilhadas do País, em que pessoas passavam curiosas em ver toda aquela gente de branco, segurando seus atabaques e balaios de pipoca, enquanto se preparavam para a caminhada.

A afirmação política e religiosa se deu no meio do caldo cultural que ocorre todos os domingos nessa avenida, um legado fantástico da prefeitura de Fernando Haddad. Em meio a aulas de dança, apresentações performáticas mais variadas e feiras de rua com barraquinhas de incenso, artesanato e roupas, caminhamos altivos e altivas, porque a rua também é nossa.

Na frente do Masp, os atabaques foram posicionados e a saudação a Exu deu início à dança, enquanto o povo se banhava de pipoca. O Brasil é muito mais axé do que gosta de dizer e, quando aquela percussão começava a tomar conta do ambiente, as pessoas se juntavam para participar.

Em tempos de tantas demonstrações de intolerância religiosa, ser parte dessa história de resistência do povo de santo é algo a ser celebrado. Viva, Obaluaiyê!

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