Professora do Instituto Federal do Amazonas denuncia assédio sexual na instituição

Denúncia de assédio nas dependências do Ifam ganha redes sociais e caso repercute na imprensa (Divulgação)
Mencius Melo – Da Revista Cenarium

MANAUS – A professora de inglês Erica Mafra, do Instituto Federal do Amazonas (Ifam), em Manaus, usou as redes sociais nesta sexta-feira,11, para divulgar um vídeo em que acusa um colega de trabalho por assédio sexual nas dependências da instituição. No vídeo, ela conta detalhes da abordagem que sofreu no dia 25 de setembro de 2020, durante a pandemia. Na gravação Erica relata que, à época, denunciou o caso ao diretor do Campus Ifam, no Centro, e “todos os superiores”. Mafra detalhou que também levou o caso ao Ministério Público Federal (MPF) e à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Ainda durante o vídeo, Erica Mafra acusa a reitoria do Campus Ifam Manaus Centro de fazer pouco caso sobre o assunto. “Melhor procurar a Procuradoria-Geral para ver se há necessidade de abrir um processo…”, relatou a professora. Na sequência, ela foi orientada a pôr “panos quentes” no assunto. “Deixa isso pra lá, isso não vai dar em nada…”. Visivelmente determinada, a professora do Ifam diz que, ao tomar postura omissa, a direção “senta no banco dos réus, junto com o meu assediador”. “Eu não vou parar enquanto não se tornar público”. “Compartilhem o máximo esse vídeo”, diz no final.

Nota

Em nota publicada nesta sexta-feira, 11, a direção comunicou que: “A reitoria do Instituto Federal do Amazonas (Ifam) e o Campus Manaus Centro (Ifam-CMC) informam que tomaram conhecimento, no dia 11 de novembro de 2022, de um vídeo veiculado nas redes sociais, denunciando assédio e que, imediatamente, adotou todas as medidas cabíveis para a apuração dos fatos”, declarou a nota

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Ainda no texto, a direção do Ifam Amazonas prosseguiu: “O Ifam, de forma sistêmica, apura todas as denúncias recebidas com clareza, transparência e seguindo todos os procedimentos estabelecidos pela Controladoria-Geral da União (CGU), assegurando, assim, o cumprimento da lei”, continuou.

Ao final, adiantou total apoio à servidora. “Para tanto, a fim de prestar todo apoio necessário à servidora, o Ifam disponibilizou uma equipe multidisciplinar, uma vez que a gestão desta instituição não compactua com atitudes desta natureza. Vale ressaltar que o Ifam, por meio de suas equipes multidisciplinares, promove, permanentemente, campanhas de combate ao assédio e discriminação em todas as suas formas”, finalizou.

Incrédula

Procurada pela reportagem, a professora Erica Mafra se disse incrédula com a nota publicada pelo Ifam Amazonas. “Estou incrédula com essa nota. Como eles podem afirmar que estão sabendo disso agora se fiz a denúncia há dois anos? Como podem afirmar que estão me dando suporte ou prestando solidariedade se fizeram pouco caso da denúncia? Não sei o que pretendem com essa atitude, mas, o que posso assegurar é que vou até o fim”, desabafou a professora.

A Cenarium entrou em contato com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Amazonas, mas a OAB/Amazonas não se pronunciou.

Assédio

O assédio sexual é definido, de forma geral, como o constrangimento com conotação sexual no ambiente de trabalho, em que, como regra, o agente utiliza sua posição hierárquica superior ou sua influência para obter o que deseja. Em 2019, essa prática foi tema de 4.786 processos na Justiça do Trabalho.

Assédio no trabalho (Divulgação/TST)

Segundo a presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), ministra Maria Cristina Peduzzi, é dever do empregador promover a gestão racional das condições de segurança e saúde do trabalho. “Ao deixar de providenciar essas medidas, ele viola o dever objetivo de cuidado, configurando-se a conduta culposa”, assinala a ministra Peduzzi. “Cabe ao empregador, assim, coibir o abuso de poder nas relações de trabalho e tomar medidas para impedir tais práticas, de modo que as relações no trabalho se desenvolvam em clima de respeito e harmonia”.

Categorias

O assédio sexual pode ser de duas categorias. Por chantagem, quando a aceitação ou a rejeição de uma investida sexual é determinante para que o assediador tome uma decisão favorável ou prejudicial para a situação de trabalho da pessoa assediada.

Já o assédio por intimidação abrange todas as condutas que resultem num ambiente de trabalho hostil, intimidativo ou humilhante. Essas condutas podem não se dirigir a uma pessoa ou a um grupo de pessoas em particular, e pode ser representada com a exibição de material pornográfico no local de trabalho.

O ministro Augusto César, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em seu livro Direito do Trabalho: Curso e Discurso, observa que o assédio sexual por intimidação se aproxima do assédio moral horizontal – no caso, qualificando-se pela motivação sexual.

Crime

No Brasil, o assédio sexual é crime, definido no Artigo 216-A do Código Penal, como “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. A pena prevista é de detenção de um a dois anos.

De acordo com a lei, o assédio é crime quando praticado por superior hierárquico ou ascendente. Há duas interpretações em relação à prática do ato: o assédio pode ocorrer pelo simples constrangimento da vítima ou pela prática contínua de atos constrangedores.

O gênero da vítima não é determinante para a caracterização do assédio como crime. “A tipificação específica é de 2001, quando se introduziu o Artigo 216-A no Código Penal, e a prática é punível independentemente do gênero”, explica a presidente do TST, ministra Maria  Cristina Peduzzi. No entanto, estatisticamente, a prática se dá preponderantemente em relação às mulheres.

Provas

Produção de provas (Divulgação/TST)

Uma das dificuldades ao ajuizar uma ação de assédio sexual é a produção de provas. “Geralmente, os atos não são praticados em público. São feitos de forma secreta, quando a vítima está sozinha”, explica a ministra Maria Cristina Peduzzi. As provas são importantes para evitar alegações falsas e podem ser extraídas de conversas por aplicativos de mensagens e até por testemunhas do fato”.

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