Relatório aponta que Brasil tem mais de 200 projetos contra educação de gênero nas escolas

O relatório se baseia em 56 entrevistas com especialistas em educação e professores de escolas públicas (Reprodução/Internet)
Com informações do UOL

SÃO PAULO – Desde 2014, legisladores — dos Estados, municípios e Congresso Nacional — apresentaram mais de 200 propostas legislativas que proíbem a educação sobre gênero e sexualidade nas escolas do Brasil. Os dados são do novo relatório da HRW (Human Rights Watch, ou “Observatório dos Direitos Humanos”, em tradução livre), lançado nessa quinta-feira, 12, e intitulado “‘Tenho medo, esse era o objetivo deles’: esforços para proibir a educação sobre gênero e sexualidade no Brasil”.

A pesquisa analisou 217 projetos de lei apresentados e leis aprovadas, entre 2014 e 2022, destinados a proibir, explicitamente, o ensino ou a divulgação de conteúdo sobre gênero e sexualidade, ou banir a chamada “ideologia de gênero” ou “doutrinação”, nas escolas municipais e estaduais. Destes projetos, 21 ainda estão em vigor no Brasil — um no Estado do Ceará, e os demais são leis municipais.

O pesquisador Cristian González Cabrera, da Divisão de Direitos LGBT da HRW, afirma que o quadro encontrado pela pesquisa é “alarmante”.

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“O que eles querem proibir é material de educação sobre gêneros e sexualidade, materiais adequados à idade dos alunos e alunas, com base científica, que quer dar às crianças e adolescentes habilidades de vida, que os ajudem a compreender a si mesmos, seus corpos, e abordar temas como igualdade de gênero, diversidade e tolerância”, diz o pesquisador.

Autocensura

O pesquisador também afirma que o efeito da propagação desses projetos é a autocensura dos professores em sala de aula. A pesquisa da HRW falou com 32 profissionais, de oito Estados brasileiros.

“Muitos têm medo de falar sobre gênero e sexualidade na sala de aula e começam a se autocensurar com esses temas. A gente documentou casos de professores que sofreram assédio, nas ruas e nas mídias sociais, e sofreram também diferentes tipos de processos administrativos nas secretarias de educação quando quiseram abordar esses temas na sala de aula”, explica Cabrera.

Para ele, os jovens também são afetados com essa espiral de silenciamento. “Se os professores se autocensuram, esses alunos não recebem, é claro, uma educação que é importante para o desenvolvimento da saúde deles. Essa é a parte mais trágica: os alunos não estão recebendo a informação que precisam”.

A HRW também documentou um esforço político para desacreditar e restringir a educação sobre gênero e sexualidade, reforçada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, que tem, pessoalmente, amplificado essa mensagem para fins políticos. Cabrera afirma que os políticos entendem o tema como uma ferramenta política para conquistar apoio de parcelas conservadoras da população.

“O presidente, por exemplo, tem sido uma das figuras que propaga desinformação sobre a falsa doutrinação que acontece nas escolas. Isso quando ele ainda era deputado federal – e continua até agora. É uma ferramenta política para muitos deles”.

Em 2020, o STF (Supremo Tribunal Federal) derrubou oito destas leis que proíbem a educação sobre gênero e sexualidade. “Apesar dessas importantes decisões, o presidente, seus ministros e muitos outros políticos a nível federal, estadual e municipal, não param de atacar esse tipo de conteúdo didático, inclusive, até muito recentemente. Isso é uma grande e grave ameaça aos direitos da educação e ao estado de direito, porque não estão respeitando essas decisões”.

O pesquisador também ressaltou a importância das secretarias estaduais e municipais de Educação. “Elas têm o papel muito importante, de dar apoio aos professores, para ensinar esse tipo de conteúdo, explicar aos pais que essa é uma parte importante da educação, assim como matemática e ciências”, diz

O relatório se baseia em 56 entrevistas com especialistas em educação e professores de escolas públicas.

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