Silvicultura ganha destaque na restauração e recuperação de florestas nativas

Floresta nativa: o monitoramento ecológico da restauração é feito periodicamente para garantir o sucesso. Na foto, a técnica usada foi regeneração natural assistida (Divulgação/UFRA)
Da Revista Cenarium Amazônia*

AGÊNCIA FAPESP (SP) – Reflorestamento. O tema da restauração de florestas nativas tem ganhado destaque nos últimos anos, tanto na iniciativa privada e no mercado financeiro, como na academia e entre governos — principalmente, no caso do Brasil, que assumiu o compromisso desde o Acordo de Paris, em 2015, de recuperar com floresta nativa 12 milhões de hectares, ou seja, praticamente, o equivalente ao território da Coreia do Norte.

No entanto, as iniciativas ainda dependem do caro processo de plantio de árvores e padecem com a falta de dados sobre o crescimento das espécies e do total de áreas recuperadas.

Pesquisa publicada na revista científica Perspectives in Ecology and Conservation contribui com o avanço do setor. Mostra que a aplicação de métodos silviculturais em projetos de restauração florestal em larga escala pode aumentar a produtividade e a rentabilidade, viabilizando o abastecimento da indústria madeireira e reduzindo a pressão sobre os biomas naturais como a amazônia.

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Os cientistas concluíram que, para alcançar alta produtividade, as cadeias de valor da restauração devem incorporar critérios específicos envolvendo uma combinação de espécies nativas; modelos de crescimento das árvores que permitam montar os planos de manejo e colheita com prazos mais curtos; bem como aliar o desenvolvimento de pesquisa e inovação a tratamentos silviculturais.

Liderado pelo engenheiro florestal Pedro Medrado Krainovic, o estudo criou um modelo que projeta o tempo de crescimento de espécies arbóreas nativas da mata atlântica até que elas obtenham “maturidade” necessária para atender à indústria madeireira.

Vista aérea de área com floresta derrubada
Reflorestamento: área remanescente de mata atlântica com floresta derrubada em Rio Vermelho, Minas Gerais (Douglas Magno/20.mai.2022/SOS Mata Atlântica)

Normalmente, as taxas de crescimento para comercialização são definidas de acordo com o tempo que a árvore leva até atingir 35 centímetros de diâmetro.

Com o novo método, os pesquisadores obtiveram uma redução de 25% no tempo de colheita e um aumento de 38% da área basal das árvores. Isso representou uma antecipação média de 13 anos na idade ideal do corte.

“Identificamos os padrões de produtividade versus tempo, o que fornece o indicativo de quando uma dada espécie pode ser manejada para obtenção de madeira para o mercado. Isso ajuda a dar viabilidade à restauração florestal em larga escala, melhorando sua atratividade para proprietários de terra e indo ao encontro dos acordos globais pró-clima”, diz Krainovic, que desenvolveu o trabalho durante seu pós-doutorado no Laboratório de Silvicultura Tropical (Lastrop) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, vinculada à Universidade de São Paulo.

Leia mais: Indígenas conduzem ações de reflorestamento da Amazônia

“Com base nos nossos dados, projetamos um cenário em que o conhecimento silvicultural estaria melhorado, proporcionando uma restauração mais atrativa para as múltiplas partes interessadas”, afirma o pesquisador.

O projeto foi conduzido no âmbito do Programa Biota-Fapesp. Também recebeu apoio por meio de outros quatro projetos, entre eles, o temático “Compreendendo florestas restauradas para o benefício das pessoas e da natureza – NewFor” e as bolsas de estudo concedidas aos pesquisadores Danilo Roberti de Almeida, Catherine Torres de Almeida e Angélica Faria de Resende, coautores do artigo.

O trabalho foi supervisionado pelos pesquisadores Ricardo Ribeiro Rodrigues, do Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal, e Pedro Brancalion, vinculado ao Lastrop e ao projeto Biota Síntese.

Contexto

Mesmo tendo sido eleita pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2022, como uma das dez referências mundiais em restauração, a mata atlântica é o bioma brasileiro que mais perdeu área florestal até hoje. Dos cerca de 140 milhões de hectares, no Brasil, restam 24% de cobertura florestal. Desse total, somente 12% correspondem a florestas bem conservadas (cerca de 16,3 milhões de hectares), segundo dados da Fundação SOS Mata Atlântica.

A foto mostra um sistema agroflorestal dentro da reserva Chico Mendes, no Estado do Acre e, ao fundo, uma floresta (Flávio Forner/Divulgação)

Porém, os esforços para conter o desmatamento vêm conseguindo resultados positivos — queda de 42% entre janeiro e maio de 2023 em relação a 2022 (de 12.166 hectares devastados para 7.088 hectares) —, além de as ações de restauração terem surtido efeito. Em 2021, a ONU estabeleceu até 2030 a Década da Restauração de Ecossistemas, um apelo para a proteção e revitalização dos ecossistemas em todo o mundo, para o benefício das pessoas e da natureza.

“A restauração precisa ter mais dados que tragam horizontes favoráveis de uso do solo. Para uma política pública é preciso ter mais informações que suportem as tomadas de decisão. E esse artigo serve de várias formas, inclusive, com uma lista de espécies que podem oferecer subsídios para o proprietário de terra. Abre uma porta para o enriquecimento de restauração florestal com finalidade econômica, mais atrativa e atingindo múltiplos objetivos, como devolver serviços ecossistêmicos a determinadas áreas”, explica Krainovic.

Os resultados do estudo devem alimentar o programa Refloresta-SP, coordenado pela Secretaria do Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado, que tem, entre seus objetivos, a restauração ecológica, a recuperação de áreas degradadas e a implantação de florestas multifuncionais e de sistemas agroflorestais.

Krainovic morou por 12 anos na amazônia e trabalhou não só em projetos de recuperação de áreas degradadas, usando espécies arbóreas com potencial econômico, como em cadeias produtivas de produtos florestais não madeireiros que abastecem a indústria de cosméticos, como sementes, óleos essenciais e manteigas.

“Um diferencial da minha trajetória é não ter ficado somente na academia. Conheço como são as empresas, a interface com os povos tradicionais nessas cadeias produtivas e a área acadêmica”, completa.

Leia mais: Amazônia Legal: em março, Rondônia perdeu 2,2 mil hectares de floresta nativa, aponta Imazon
(*) Com informações da Folhapress
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