Tradição de judas gera debate racial envolvendo boi-bumbá do Festival de Parintins, no AM

O 'judas' do atual presidente do Garantido, Antônio Andrade, amanheceu dependurado em um poste em frente ao 'Bar do Lorinho', em Manaus (Reprodução/Redes Sociais)
Ana Pastana – Revista Cenarium

MANAUS – A tradicional “malhação do judas”, que acontece nas madrugadas do Sábado de Aleluia, gerou um intenso debate nas redes sociais, neste fim de semana, por conta de uma polêmica ocorrida em Manaus. Um boneco alusivo ao presidente da Associação Folclórica Boi-Bumbá Garantido (AFBBG), Antônio Andrade, foi pendurado em frente ao “Bar do Lorinho”, tradicional reduto da torcida azul e branca do Boi Caprichoso, na capital amazonense. Nas redes, o bar foi acusado de racismo. O bar fica localizado na Avenida Constantino Nery, 2.230, Chapada, Zona Centro-Sul.

Com cartaz pendurado no peito, escrito “Fica A.A”, a imagem do boneco chegou às redes sociais e, a partir daí, iniciou-se um debate sobre racismo. Nas redes, a gestão de Antônio Andrade se solidarizou com o mesmo. O bumbá repudiou a ‘brincadeira’: “O discurso da liberdade de expressão não pode se confundir com discurso de ódio. Em pleno 2023, com tantos debates raciais sendo trazidos à tona, inclusive, o conceito de ‘racismo recreativo’, do eminente professor Adílson Moreira, certas ‘brincadeiras’ não devem ser estimuladas em nome da ‘liberdade de expressão’“, disse a nota.

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Para a torcedora Ana Lourdes, a ‘malhação do judas’ é uma brincadeira datada que não tem mais razão de existir (Reprodução/Redes Sociais)

Na sequência, o texto disparou contra quem fez a “brincadeira”, considerada racista, sobre o atual gestor do Garantido: “Comparam o presidente Antônio Andrade, um homem negro, à figura de judas, que costuma ser apedrejado no sábado de aleluia! A quem interessa ‘brincar’ com a incitação ao linchamento de um homem negro?! Nossa solidariedade a Antônio Andrade e a quaisquer pessoas negras que passem pelo crime de racismo!”, criticou o texto.

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Para outros torcedores encarnados, a atual gestão do Boi Garantido exagera na ‘militância’ política (Reprodução/Redes Sociais)

Moderação

Para o psicólogo e ativista do movimento afro do Amazonas, Alberto Jorge, é preciso moderação. “Acredito que a malhação do judas é uma tradição, e que precisa se manter, mas também acredito que a malhação precisa ser ressignificada e, isso pode, de alguma forma, torná-la politicamente correta, o que, evidentemente, pode descaracterizar a brincadeira”, opinou. “Lembro, quando criança, que na malhação, as críticas eram variadas, falava-se do vizinho avarento, daquele que não tomava banho, dos sovinas, pães-duros e até os que não tinham casado”, recordou. “Claro que, nos dias de hoje, é preciso muito cuidado”, alertou.

Presidente da Articulação Amazônica dos Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro de Matriz Africana (Aratrama), Alberto Jorge não vê preconceito na manifestação em frente ao reduto do Caprichoso, em Manaus. “Só o fato de ser o boneco preto, representando um homem preto, eu não vejo maiores problemas, e se fosse o judas de um homem branco, teria algum potencial ofensivo?, questionou. Penso que o que pode caracterizar o crime de racismo e injúria racial é o que está escrito na placa”, observou.

Referência

Para a advogada Luciana Santos, ativista do movimento negro, a pilhéria feita com o presidente do Garantido ganha um teor humorado e não entra na questão racial. “Vejo que não tem uma referência racial, mas uma alusão ao seu desempenho como administrador do boi, então, não vejo que seja um caso de racismo”, pontuou a profissional. “Ninguém o está acusando de ser um mau administrador por ser uma pessoa negra, porque se fosse o caso, aí, sim, seria racismo”, teorizou Luciana. Procurado pela reportagem da REVISTA CENARIUM, o presidente Antônio Andrade não atendeu as ligações e não deu retorno via redes sociais.

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