Tragédia anunciada: estudo de 2021 alertou sobre risco de queda de pontes na BR-319

Duas pontes desabaram na BR-319 com menos de dez dias de intervalo (Eric Cezne/Divulgação)
Ívina Garcia – Da Revista Cenarium

MANAUS – A queda de duas pontes nos quilômetros 23 e 25 em trecho pavimentado da BR-319, localizado no município do Careiro da Várzea, no final de setembro, foi uma tragédia anunciada, segundo pesquisadores do Programa de Pesquisa em Biodiversidade do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (PPBio/Inpa).

O artigo “Burying water and biodiversity through road constructions in Brazil“, em tradução literal “Enterrando a água e a biodiversidade através da construção de estradas no Brasil“, alertou sobre os perigos ainda em 2021.

A pesquisa foi apresentada ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) durante as audiências públicas sobre o trecho do meio, realizadas em 2021 em Manaus. Conforme o estudo, havia uma incompatibilidade entre as obras previstas para a recuperação da rodovia e as características geográficas locais.

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Duas pontes desabaram na BR-319 com menos de dez dias de intervalo (Eric Cezne/Divulgação)

Segundo o ambientalista e geógrafo Carlos Durigan, a BR-319 foi construída em cima de aterros, ou seja, vários trechos possuem rios cobertos por terra ou entulho, para que fosse nivelado o terreno, e esse tipo de obra precisa de maior atenção. “Esses aterros precisam ter monitoramento e manutenção frequente e em determinados trechos, precisam de obras melhor estruturadas“, diz o especialista.

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Durigan pontua que a sazonalidade, ou seja, quando as partes abaixo das pontes ficam inundadas e depois sofrem com o calor intenso da seca, acabam afetando qualquer tipo de obra nesses ambientes. “A BR-319 tem seu leito estabelecido ao longo de quilômetros de aterros, uma vez que cruza extensas áreas de várzeas e outros tipos de paisagens aquáticas, que sofrem inundações anuais“, explica.

O desabamento das estruturas afetou mais de 140 mil pessoas nos municípios de Careiro da Várzea, Autazes, Careiro e Manaquiri, no interior do Amazonas. Conforme mostrou a REVISTA CENARIUM, preços de produtos ficaram elevados, correndo risco, inclusive, de desabastecimento.

Queda de pontes da BR-319 dificultou abastecimento de cidades do interior do Amazonas (Divulgação)

Um dos autores do artigo, o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) William Ernest Magnusson esclarece que o problema no local se dá pela forma como foi efetuado o aterramento e que, nas imagens da queda da ponte, foi possível notar que a água havia cavado em volta dos suportes da ponte.

O aterramento de Áreas de Proteção Permanente [APPs], na cabeceira das pontes, direcionou toda a força da água para as colunas que apoiam as estruturas durante o período da cheia. Não é o pulso do rio que é o problema, o problema é o aterramento das APPs, com rampas de acesso em vez de pontes atravessando toda a área“, detalha.

Vale ressaltar que, segundo o Artigo 63 da Lei nº 9.605 /1998, de crimes ambientais, a terraplanagem ou aterramento de APP são proibidos por lei e configuram o crime. O desrespeito a essa norma culminou no desabamento das pontes.

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O rio enche todos os anos, provocando a infiltração de água no solo. Quando o rio baixa e ocorre a ‘exfiltração’ de água no solo, existe o risco desta terra desagregar e levar ao colapso do solo, ao desabamento do que foi aterrado, terraplanado, como acontece com trechos da estrada. Ainda mais em estradas de planícies baixas, como no caso da BR-319“, disse o pesquisador.

De responsabilidade do governo federal, por meio do Dnit, o trecho da segunda ponte recebeu uma obra provisória, de uma passagem, feita a partir de aterro. Na primeira ponte uma balsa foi disponibilizada para fazer travessia gratuita de quem passa pelo local.

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