CRÔNICAS DO COTIDIADO: um ‘oriente’ cada vez mais próximo

Nossas tentativas de aproximação com o Oriente foram sempre marcadas por preconceitos, pavores estranhos e até mesmo uma certa xenofobia nos últimos tempos. De onde essas coisas vêm? Como lograram “credibilidade” entre nós? Quais têm sido os efeitos sobre nossas relações internacionais? E o que pode mudar com a nova geopolítica da “desglobalização das cadeias produtivas”? É claro que seria pretensão demais discorrer sobre todas essas questões, tanto pela complexidade que envolvem quanto pela especialidade de conhecimentos que exigem. Contudo, trago-as como questões próprias do momento e que precisam ser referenciadas e levadas a sério, porque as coisas estão mudando na geopolítica mundial. E, cada vez mais, nossa economia se vê dependente dessas novas relações político-econômicas com esse “Oriente”, bem diferente daquele criado pelo Colonialismo.

Os primeiros chineses chegaram ao Brasil vindos de Macau, ex-possessão portuguesa na Ásia, junto com presentes de ouro e sementes de chá, dadas à Coroa Portuguesa, fugida de Lisboa. Nos meados do século passado, o “Perigo Amarelo” foi objeto de discussão intensa, não só pela ascensão do Comunismo Chinês e o nascimento da República Popular da China (1949), quanto pelo fato de ter sofrido uma campanha nacional, promovida por Arthur César Ferreira Reis (1906-1993) –   escolhido governador do Estado do Amazonas pela Ditadura -, e o senador Antovila Rodrigues Mourão Viera (1900-1963) que se opunham à “Ocupação da Amazônia” por estrangeiros, em especial japoneses e chineses, ambos inspirados nos pensadores reacionários Oliveira Lima, Sílvio Romero e Euclides da Cunha, os mesmos que emprestaram seus fundamentos ideológicos à política da Ditadura na Amazônia Brasileira, cujos slogans circulantes falavam: “Integrar para não entregar” e “Trazer homens sem terras do Nordeste para as terras sem homens do Norte”, coisas ridículas assim, que explicam, em parte, nossas tragédias.

No momento da Renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República, seu vice, João Goulart, encontrava-se em visita à China. Imprensa, Igreja Católica e Partidos Políticos de direita, com a retaguarda das Forças Armadas, unem-se sob pretexto de que haveria uma trama para instaurar o Comunismo no Brasil e impediram, assim, a posse de Jango. A solução foi uma mudança constitucional que nos levou ao Parlamentarismo, o “ovo de serpente” do Golpe Militar de 1964. Paradoxalmente, foi ainda na ditadura, em 1974, que o Brasil reconheceu a República Popular da China: as relações diplomáticas tomaram o rumo da normalidade; surgiram projetos de cooperação e chegamos às exitosas trocas comerciais que asseguram, hoje, altos rendimentos à nossa balança comercial; e a presença da China em vários negócios da economia brasileira, inclusive na Amazônia.

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Enquanto potência econômica, prestes a superar os Estados Unidos da América, e como articuladora de tendências que podem levar ao rompimento das atuais relações de poder mundial, não faz sentido ficar longe desse jogo, até porque a China tem interesses visíveis na economia brasileira. No entanto, o trato com os imperialismos merece os devidos cuidados, coisas que nem sempre a conjuntura de crise vivida pelo capitalismo permite levar em conta. O ideário político parece ser o que menos importa. Vale mais a capacidade de negociação entre as partes para preservar interesses econômicos que devem ficar à margem do pragmatismo – muito exaltado nas relações internacionais.

Além disso, devemos rever a nossa visão de “Oriente”, herdada dos europeus no seu processo de dominação sobre os povos e que os consideravam inferiores e da visão imperialista americana, que tinha na região o seu ponto de apoio para sustentação da Guerra Fria. O “Império do Meio”, como já foi conhecido, parece estar pronto para retomar a sua posição de centro do mundo, não mais pela “Rota da Seda”, mas pela “Rota das Novas Tecnologias” e das mudanças mais avançadas que o “capitalismo de estado” logrou alcançar. E que, certamente, assombraria os marxistas ortodoxos, que da China esperavam a vitória definitiva da doutrina.

WALMIR DE ALBUQUERQUE BARBOSA é jornalista profissional.

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(*)Jornalista Profissional, graduado pela Universidade do Amazonas; Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo; Professor Emérito da Universidade Federal do Amazonas.

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