‘Ver-O-Peso’: mercado em Belém tem poções que prometem milagres

Substâncias prometem curas "milagrosas" e soluções para todos os problemas (Giovanna Stael/Folhapress)
Da Revista Cenarium*

BELÉM (PA) – “Esse você bota uma gotinha na ‘perseguida’ e faz o homem ficar louco. O homem também pode usar, na cabeça do pênis, para deixar a pessoa mais apaixonada“. Foi com essa descrição do “superpoder” de um perfume que a vendedora Claudiana, 36, atraiu a reportagem para os produtos à venda na barraca da Maria Loura do mercado Ver-O-Peso, em Belém, considerado o maior da região amazônica.

Nas mãos, um líquido de coloração alaranjada acondicionado em pequenos frascos —igual aos frascos de doses de vacina– escrito “Óleo da Bota”.

Fabiana, 26, herdou da mãe a barraca de poções no mercado, que antes pertenceu também à vó
Fabiana Araújo, 22, herdou da mãe a barraca de poções no mercado, que antes pertenceu à avó – Giovanna Stael/Folhapress

Indagada sobre o nome, Claudiana continua: “‘bota’ durante a relação sexual com a pessoa amada, para ela ficar mais apaixonada”. O perfume é feito à base de plantas naturais com propriedades atrativas, continua a vendedora. Dentre as espécies, “agarradinho”, “carrapatinho” e “chora nos meus pés”.

PUBLICIDADE

Outros, são mais explícitos, como um que promete atrair o público homossexual e um para aumentar o tamanho do pênis.

A profusão de frascos, seja em garrafas plásticas de 1 litro ou em frascos de 30 ml, compõe o setor de ervas do Ver-O-Peso, também chamado popularmente de “Ver-As-Ervas”. Lá, atualmente, há 80 barracas cadastradas, a maioria passadas às famílias por gerações e com conhecimento tradicional sobre a produção artesanal.

Os ingredientes dos perfumes não são declarados, mas alguns trazem no rótulo informações como óleo de andiroba, casca de copaíba e jiboia branca, dentre outros.

Além destas, aparecem também arruda, manjericão, manjerona, alecrim e cravo, misturados em frascos para compor banhos aromáticos –as poções–, que prometem as mais variadas sortes: “Passa no Concurso”, para quem está em busca de um novo emprego; “Perfume do Estudante”, para aqueles com dificuldade de concentração; e “Quebra Inveja”, para acabar com o mau olhado.

Depende do que você vai querer. Se você quer um atrativo, esse aqui de essência de jasmim, você mistura um pouco como colônia. Agora se você quer ‘abrir caminho’ [ter sucesso na carreira, por exemplo], pode preparar um banho“, explica Fabiana Araújo, 22.

Araújo é a quinta geração da barraca de sua família. “Tudo o que aprendi foi vendo a minha vó fazer“, conta. Segundo ela, há pessoas que são “preguiçosas”, mas ela gosta de pegar as ervas mesmo, macerar e fazer a extração do óleo, para ter o melhor resultado. “Quem quer só as ervas para um banho, nós vendemos também“, diz.

Ela se refere às próprias ervas secas, dispostas em ramos já prontos para serem preparadas em casa. “Eu sou das antigas, e gosto de fazer do zero, mas muita gente vem procurar um banho de arruda.” Outros preparos são para infusões, como chás, que prometem curar todos os males.

Apesar de muitas ervas ali serem comuns, os erveiros do Ver-O-Peso mantêm a tradição de cultivo e preparo a partir de espécies amazônicas, conta João, da Banca do João. Ele diz que frequentemente recebem treinamento sobre extração de óleos essenciais com as cooperativas agricultoras e extrativistas que trabalham para o gigante de cosméticos Natura.

Tal decisão de trabalhar em acordo se deve a um imbróglio jurídico, de 2005, quando produtoras e produtores artesanais acusaram a marca de biopirataria e de apropriação do conhecimento tradicional.

Um ano depois, a Justiça deu decisão favorável aos produtores, e a empresa reconheceu o uso de informações fornecidas por vendedoras de ervas na produção de perfumes. Houve um compromisso da empresa em assinar o primeiro contrato de participação de benefícios do país.

Há também vasta literatura científica que busca ressaltar o caráter sociológico das erveiras do Ver-O-Peso. Um desses artigos, publicado na revista Perspectivas em Ciência da Informação, em 2013, qualifica essa formação como “a aquisição e transmissão desse saber pela observação e oralidade no contato cotidiano do trabalho com esses produtos“.

Leia a matéria na íntegra neste link.

(*) Com informações da Folhapress
PUBLICIDADE

O que você achou deste conteúdo?

Compartilhe:

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Se achar algo que viole os termos de uso, denuncie. Leia as perguntas mais frequentes para saber o que é impróprio ou ilegal.