Abraji repudia censura de juíza contra matéria da CENARIUM e levanta debate sobre ‘assédio judicial’

Presidente da Abraji, Katia Brembatti (Divulgação)
Eduardo Figueiredo – Da Revista Cenarium

MANAUS – A presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Katia Brembatti, repudiou a decisão da juíza plantonista do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), Lídia de Abreu Carvalho, que determinou a retirada de matéria da REVISTA CENARIUM referente ao Procedimento Investigatório Criminal 807/2016, do Ministério Público do Amazonas (MP-AM), originando a denúncia por estupro de uma criança de 12 anos contra o deputado federal Sidney Leite (PSD-AM).

Em entrevista ao programa “Boa Noite, Amazônia“, exibido pela Rede Onda Digital, na noite dessa segunda-feira, 27, Katia afirmou que a decisão da magistrada é completamente inadequada. “A Abraji entende que esse tipo de decisão é completamente inadequada porque impede que as pessoas fiquem sabendo de questões de interesse público e que são verdadeiras”, disse a presidente da associação.

Na análise da presidente da Abraji, a justificativa usada pela juíza para censurar a matéria da CENARIUM não faz sentido, uma vez que foram seguidos critérios jornalísticos. “Não faz sentido, na lógica, à luz do direito, das regras que a gente vive em comunidade, hoje, entender que a Justiça manda retirar do ar o que seria, de alguma forma, um conteúdo verdadeiro e publicado dentro de contexto”, afirma a jornalista, que também destaca não haver nenhuma obrigação de trânsito julgado para publicação de notícias.

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“Não há, na legislação brasileira, nenhuma designação, uma obrigação de que haja trânsito em julgado para que você noticie um fato […] Em algumas situações parece que há dois pesos e duas medidas. A gente tem várias situações que são cobertas pela imprensa, ainda na parte de inquérito, quando nem chegou no Ministério Público ainda”, completa.

Katia afirmou que a decisão da magistrada Lídia de Abreu é completamente inadequada (Divulgação)

Intimidação judicial

Katia explica que existem diversas formas de assédio judicial e que vários empresários e políticos entram com ações judiciais usando seu poder econômico para intimidar jornalistas com o objetivo de silenciar os veículos de comunicação. De acordo com a jornalista, a Abraji identificou mais de 5 mil pedidos de retirada de conteúdo, no Brasil, sendo mais de 3 mil realizados por políticos.

“É importante dizer que uma única ação, um único processo judicial que impeça a população de ter uma informação correta, é um grande prejuízo, e já tem um efeito sobre o veículo de comunicação, o que não me parece ser o caso da Revista Cenarium, mas para outros veículos menores que se sentem intimidados e acaba funcionando como um cala-boca, e é isso que a gente não quer”, destaca.

Katia lembra ainda que qualquer crime é de interesse da imprensa, por ser um atentado contra a sociedade, contra as regras de como viver em comunidade. A jornalista destaca que toda vez que há um crime, a imprensa tem o interesse de levar a informação para a sociedade.

“Quando há intenção de recorrer à Justiça para tentar impedir que aquele conteúdo chegue ao público, isso é uma tentativa de cerceamento de imprensa, isso é uma tentativa de intimidar os jornalistas e, portanto, nós, da Abraji, não podemos aceitar nenhum tipo de tentativa de intimidar jornalistas. Toda vez que jornalista é calado, a sociedade perde a oportunidade de ficar sabendo de algo importante”, finaliza a presidente da Abraji.

Assista à entrevista

A presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Katia Brembatti, em entrevista ao programa ‘Boa Noite, Amazônia‘, exibido pela Rede Onda Digital (Boa Noite, Amazônia/Onda Digital)

Entenda o caso

A matéria da CENARIUM baseou-se na denúncia do Ministério Público, com mais de 200 páginas, na qual juntou depoimentos e provas da vítima e de familiares dela sobre a acusação de crime de estupro atribuído a Sidney Leite, em 2004, quando o parlamentar era prefeito do município de Maués (a 268 quilômetros de Manaus).

No texto publicado e censurado, não há menção sobre “condenação” do deputado, limitando-se a tratar da denúncia formalizada, em 2016, pelo então procurador-geral de Justiça Fábio Braga Monteiro.

No despacho em que censura a matéria da CENARIUM, a juíza preocupou-se com a imagem do deputado Sidney Leite ao conceder “tutela antecipada”, que é o julgamento antes de ouvir as partes relacionadas, neste caso, o próprio Tribunal de Justiça do Amazonas, sobre a tramitação do processo contra o parlamentar, o Ministério Público, que denunciou Sidney, e o veículo de comunicação que publicou o conteúdo, conforme descrito abaixo:

(…) Os fatos narrados na inicial fornecem juízo cognitivo suficiente à compreensão da urgência da medida requestada em sede de antecipação dos efeitos concretos da tutela jurisdicional, isto porque a manutenção das publicações realizadas, e aqui contestadas, evidencia probabilidade de danos de difícil reparação à imagem do autor (deputado Sidney Leite), recomendando o deferimento da medida antecipatória almejada.

Lídia de Abreu Carvalho afirmou ainda que o teor da publicação da CENARIUM, baseada em informações do Ministério Público, “excedeu o conteúdo jornalístico” na medida em que nele foi emitido juízo de valor “depreciativo” ao deputado Sidney Leite.

Trecho da decisão de Lídia de Abreu Carvalho (Reprodução)

Leia também: Juíza proíbe CENARIUM de falar sobre denúncia do MP de estupro contra deputado do AM   

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