Commodity amazônica: Congresso ensaia aprovar mercado de carbono no primeiro semestre

Cenário do mercado de crédito de carbono representado por cédulas de dinheiro e chaminés de usina em atividade (Montagem: Thiago Alencar/Revista Cenarium Amazônia)
Valéria Costa – Da Revista Cenarium Amazônia

BRASÍLIA (DF) – O Brasil inicia 2024 com uma grande responsabilidade ambiental: posicionar-se no cenário internacional do mercado de crédito de carbono. O primeiro passo foi dado para enfrentar resistências em relação a esse novo ativo que pode potencializar o Tesouro Nacional: a aprovação de um Projeto de Lei (PL) na Câmara dos Deputados no fim deste ano.

A matéria vai ser analisada, agora, no Senado, e a aposta é que a proposta seja votada ainda no primeiro semestre de 2024 e complete propostas de lei que o Congresso Nacional vem aprovando dentro da chamada “pauta verde”.

Usina emite poluição na atmosfera (Reprodução/Internet)

O texto aprovado na Câmara reúne vários projetos de lei que abordavam o tema e que tramitavam há quase dez anos na Casa legislativa. Um destes projetos é o do ex-deputado federal Marcelo Ramos (PSD), que usou suas redes sociais para comemorar o avanço do debate.

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A edição impressa da REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA, publicada em junho de 2023, mostrou o potencial econômico do mercado de carbono para a população que vive no interior. Levantou o debate sobre a ausência de legislação para destravar investimentos e alertou sobre uma “pedalada verde” que considera biocombustíveis e hidroelétricas no cálculo da iniciativa.

O mercado de carbono foi criado para forçar as economias a reduzirem as emissões de gases do efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2) e o metano (CH4), que são responsáveis pelo aquecimento da terra e impulsionam a atual crise climática marcada por eventos extremos de calor, chuvas e secas.

Órgão regulador

Para que este mercado seja regulado e funcione, de fato, o projeto cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), órgão que vai ser o responsável por concretizar e viabilizar toda essa transação comercial, mas com grande apelo ambiental.

Para o advogado especialista em Direito Ambiental e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), João Daniel Macedo Sá, esse mercado é uma “construção inevitável” por conta da necessidade de se regulamentar atividades que são geradoras de emissões de gases. “Neste momento, ele é muito positivo, pois demonstra uma vontade do País em avançar numa pauta que é espinhosa e delicada”, diz o especialista.

Nesse primeiro momento, a proposta alcança atividades empresariais e industriais que emitem mais de 10 mil toneladas de carbono por ano. Macedo lamenta, no entanto, que a atividade agropecuária ficou de fora do projeto de lei, como uma obrigatoriedade, após forte pressão da bancada ruralista da Câmara dos Deputados.

“Não se levou em conta qual é o volume de emissões que são geradas pela atividade. Se isso fosse colocado no papel, a gente sabe que é o maior emissor do País em termos quantitativos. Ficou de fora no sentido de ser obrigatória. Significa que, se passar dessa forma o projeto, a gente não vai ter obrigatoriedade, nem implementação de multa, de instrumentos de comando e controle”, explicou Macedo sobre a atividade agropecuária.

Amazônia

João Daniel Macedo ressalta a grande importância que o mercado de crédito de carbono terá para a Amazônia, principalmente, pela existência de matrizes econômicas ligadas a polos industriais de desenvolvimento e também a atividade rural. “Grande parte da região amazônica tem essa pressão, ainda, pelas atividades rurais”, destaca.

O especialista também chama a atenção ao protagonismo que os Estados da Amazônia poderão ter com o crédito de carbono. Na discussão do texto, os governadores da região pressionaram o relator da proposta, o deputado federal Aliel Machado (PV-PR), para que estes entes federativos possam desenvolver créditos de carbono em seu território a partir de uma quantificação do desmatamento que é evitado. “Isso está muito ligado à questão do RED, uma das variáveis que se leva em consideração no mercado voluntário hoje”, acrescenta o advogado.

João Macedo destaca que o Estado do Pará, por exemplo, está com um mercado em franca construção, com atos normativos baixados pelo poder público, com o objetivo de organizar uma legislação de olho na COP30, que acontece na capital paraense, Belém, em 2025.

Regulamentação

Líder da bancada federal do Amazonas no Congresso Nacional, o senador Omar Aziz (PSD) adiantou à REVISTA CENARIUM que vai votar a favor da matéria no Senado porque, na sua avaliação, é um importante instrumento de proteção da floresta amazônica e uma alternativa econômica para o Estado.

“A nossa floresta, principalmente no Amazonas, é a maior floresta tropical nativa do Planeta e a regulamentação do mercado de carbono permite gerar riqueza, trazer dinheiro, porque há uma capacidade da nossa floresta de sequestrar carbono da atmosfera e combater pobreza das populações tradicionais”, disse o parlamentar.

Mudanças climáticas

Com voto favorável à matéria, o deputado federal Airton Faleiro (PT-PA) disse à REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA que a tendência é que esse debate ganhe corpo e a cobrança pela responsabilidade frente às mudanças climáticas também.

Ele afirma que o mundo tem que ter compreensão de que o Brasil e a Amazônia, especificamente, estão dispostos a cumprir a meta de desmatamento zero que impacta na mudança do clima e na responsabilidade social com os povos tradicionais, povos indígenas, quilombolas, extrativistas e agricultores familiares que preservam o meio ambiente.

“Temos que ter mais investimentos além do que temos hoje, no Fundo Amazônia, para ajudar a cuidar desse equilíbrio climático, seja ambiental ou social. Então, a regulamentação do mercado de carbono é muito importante tanto do ponto de vista de você estabelecer as regras do jogo, quanto para a iniciativa privada, como as regras jurisdicionais dos Estados, como também esse mercado livre; e, na nossa opinião, essa regulamentação vai facilitar, inclusive, investimentos em processos de reflorestamento, com a arrecadação, e também onde essas populações preservam a natureza, o meio ambiente, elas sejam contempladas com recursos”, disse o parlamentar.

Mercado de fato

O especialista ambiental João Daniel Macedo ressalta que, quando se cria um mercado se cria limites e, com isso, a necessidade de novas tecnologias e estratégias para a redução de emissões de gases na atmosfera. “Essa é a ideia do mercado: é forçar esse avanço”, destaca.

Segundo ele, a partir do momento que for estabelecido um mercado regulado de crédito de carbono, isso vai entrar na contabilidade das empresas, passa a gerar números, custos e lucros dentro de uma dinâmica de contabilidade.

“Então, aqueles que tiverem investimentos e condições de fazer essa mudança de matriz para reduzir emissões vão se beneficiar a partir de tecnologias e da implementação de novos mecanismos que forçam a redução. Aqueles que não tiverem condições técnicas ou investimentos em tecnologia, para que isso aconteça, vão ficar para trás”, analisa.

Leia mais: Mercado de Carbono: projeto pode ser votado antes da COP28
Editado por Jefferson Ramos
Revisado por Adriana Gonzaga
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