Governo Bolsonaro deixou de agir em Terras Yanomami em pelo menos sete ocasiões

Em 2022, dos três ciclos de operações planejadas para a retirada dos invasores da Terra Yanomami, apenas uma contou com aeronaves das Forças Armadas (Christian Braga/ISA)
Da Revista Cenarium*

BOA VISTA (RR) – Durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), as Forças Armadas deixaram de atuar no combate ao garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami (TIY) ou tiveram uma atuação insuficiente em, pelo menos, sete ocasiões — o que enfraqueceu ações policiais e contribuiu para a expansão da atividade criminosa no território.

O ápice da atuação de mais de 20 mil invasores foi em 2022, o último ano do governo.

A Folha ouviu fontes com atuação direta em ações de tentativa de desmobilização de garimpeiros, consultou documentos enviados ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Ministério Público Federal (MPF) e analisou decisões judiciais, o que permitiu identificar sete situações envolvendo os militares que, no fim das contas, favoreceram a permanência do garimpo na Terra Yanomami (TY).

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As águras barrentas do rio Mucujaí indicam a presença de garimpo na região de Surucucu, dentro da Terra Indígena Yanomami
As águas barrentas do Rio Mucajaí indicam a presença de garimpo na região de Surucucu, dentro da Terra Indígena Yanomami (Lalo de Almeida/Folhapress)

O território fica numa região de fronteira com a Venezuela. O Ministério da Defesa de Bolsonaro barrou o fornecimento de aeronaves a operações da Polícia Federal (PF), em 2022, feitas em cumprimento à decisão do STF. Quando forneceu, os militares cobraram ressarcimento.

Houve, ainda, pedidos do tipo para uso de base militar em Surucucu e falta de monitoramento do espaço aéreo do garimpo.

A conivência com o garimpo ilegal e a desassistência em saúde indígena na Terra Yanomami provocaram uma crise humanitária no território, com explosão de casos de malária, desnutrição grave e outras doenças associadas à fome, como infecções respiratórias.

No último dia 20, o Governo Lula (PT) declarou estado de emergência em saúde pública na terra indígena. Os casos que demandam mais urgência – tanto na assistência em saúde, no próprio território, nas regiões de Surucucu e Auaris, quanto nos transportes aéreos a hospitais em Boa Vista (RR) – são os de desnutrição grave e malária.

Cinco dias depois, em atendimento a uma determinação do ministro da Justiça, Flávio Dino, a PF, em Roraima, instaurou um inquérito para investigar a suspeita de crime de genocídio de indígenas Yanomami durante o Governo Bolsonaro.

Serão investigados garimpeiros (tanto os que estão na linha de frente quanto os operadores da logística do garimpo, donos de maquinários e aviões), ex-coordenadores de saúde indígena e agentes políticos, o que pode incluir o próprio ex-presidente, incentivador de mineração em terras indígenas.

As frentes de investigação sobre genocídio foram ampliadas com uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigue a suposta prática do crime por parte de autoridades do Governo Bolsonaro.

Barroso encaminhou, ainda, a determinação de investigação sobre genocídio e outros crimes ao Ministério Público Militar (MPM), um indicativo de que crimes militares foram cometidos por fardados ou ex-fardados durante a gestão passada.

Aldeia Yanomami em Roraima (Amanda Perobelli/2.fev.23/Reuters)

Em 2022, dos três ciclos de operações planejadas para a retirada dos invasores da Terra Yanomami, apenas uma contou com aeronaves das Forças Armadas, segundo fontes da PF ouvidas pela reportagem sob a condição de anonimato.

Esses ciclos foram pensados para cumprimento de ordem do STF de desintrusão em sete terras indígenas tomadas por garimpo, entre as quais a Terra Yanomami, a maior do Brasil.

No único ciclo em que houve fornecimento de aeronaves, a PF desembolsou de seu orçamento R$ 2,5 milhões para o custeio de horas por voo de uma única aeronave. Na operação, houve destruição de motores e equipamentos a serviço do garimpo.

As sete recusas militares no Governo Bolsonaro:

  • Fornecimento de aeronave para uma operação na terra indígena, em 2022, somente mediante custeio pela PF;
  • Negativa do fornecimento de aeronave em uma segunda operação em 2022;
  • Negativa do fornecimento de aeronave em uma terceira operação em 2022;
  • Recusa de solicitação de monitoramento do espaço aéreo nos moldes especificados pela PF;
  • Cobrança pelo uso da base militar na região de Surucucu, onde crise de saúde foi mais intensa;
  • Falta de apoio logístico para retomada da região de Homoxi, onde garimpeiros inviabilizaram uso de pista de pouso da saúde indígena e atearam fogo em unidade de saúde;
  • Falta de controle do tráfego aéreo de Roraima e de intercepção de aeronaves supostamente usadas no garimpo.
(*) Com informações da Folhapress
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