Lula diz ter ‘profunda gratidão’ pela África e afirma que Brasil pode retribuir período de escravidão

O presidente Lula com o presidente de Cabo Verde, José Maria Neves (Ricardo Stuckert/Divulgação/PR)
Da Revista Cenarium*

BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse nesta quarta-feira, 19, ter “profunda gratidão” pela África por tudo que foi produzido durante o período da escravidão no Brasil e afirmou que a forma de retribuir ao continente pode ser por meio de transferência tecnológica e ajuda com capacitação de profissionais.

A fala ocorreu durante declaração conjunta com o premiê de Cabo Verde, Ulisses Correia e Silva, enquanto o petista esteve no arquipélago africano, em sua primeira viagem à África neste terceiro mandato.

Lula fez uma parada no País para abastecer a aeronave no retorno da cúpula UE-Celac em Bruxelas — portanto, a ida não foi considerada uma visita de Estado. Ele disse ainda que vai recuperar boa relação com os países do continente, abrir novas embaixadas e ajudá-los.

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“Nós, brasileiros, somos formados pelo povo africano. Nossa cultura, nossa cor, nosso tamanho são resultado da miscigenação de indígenas, negros e europeus”, disse Lula. “Temos uma profunda gratidão ao continente africano por tudo que foi produzido durante 350 anos de escravidão no nosso País.”

“Achamos que a forma de pagamento que um País como o Brasil pode fazer [está em] tecnologia e na possibilidade de formação de gente para que tenha especialização para as várias áreas que o continente africano precisa, [como] industrialização e agricultura”, seguiu Lula.

“Queremos, agora, com minha volta à Presidência, recuperar a boa e produtiva relação que o Brasil tinha com o continente africano.”

Lula disse ainda que pretende visitar muitos países africanos, além de abrir embaixadas. “No próximo ano, quero visitar muito mais [países africanos] e abrir embaixadas onde o Brasil ainda não tem. Quero fazer muito mais reuniões para fazer [com] que a gente defina no que o Brasil pode ajudar mais no continente africano”.

Presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, e Luiz Inácio Lula da Silva (Ricardo Stuckert/Presidência da República)

Sem mencionar diretamente o antecessor Jair Bolsonaro (PL), Lula disse ainda que o Brasil poderia ter ajudado africanos com produção de vacina contra a Covid-19, se não tivesse um governo negacionista à época. “Lamentavelmente, tivemos um desgoverno que não cumpriu com aquilo que é essencial, que é cuidar do ser humano.”

A África foi o continente que menos acessou imunizantes em meio à pandemia. Até hoje, a região tem apenas 32% de sua população com duas doses ou a dose única do imunizante, segundo dados do projeto Our World in Data. Especialistas, mais de uma vez, afirmaram que muitas doses doadas por outros países chegavam com prazo curto de validade, o que dificultava sua distribuição para áreas mais remotas.

Depois, no Twitter, ao compartilhar fotos com o presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, Lula disse que também foi abordado entre os dois a importância dos estudantes cabo-verdianos no Brasil — o próprio presidente do arquipélago foi um deles, quando estudou na FGV nos anos 1980. “Volto com a promessa de reunir nossos países para pensarmos uma agenda comum”, escreveu Lula no post.

O episódio despertou críticas de ativistas que argumentaram que não há saldo positivo da escravidão, e citaram, ainda, que a mestiçagem, muitas vezes, foi fruto de violência contra mulheres negras, e que a ideia de elogiar a mistura de raças está ligada ao mito da democracia racial que foi usado na história brasileira para negar a existência do racismo.

As falas do petista chamam a atenção para um dos traços de suas declarações que já geraram incômodo entre apoiadores e mesmo entre pessoas próximas à Presidência: o improviso. O fator sobressaiu, em especial, nas diversas declarações do presidente sobre a Guerra da Ucrânia, quando mais de uma vez foi acusado de favorecer a Rússia de Vladimir Putin em detrimento da Ucrânia de Volodimir Zelenski.

Em 2005, durante seu primeiro mandato no Palácio do Planalto, Lula pediu perdão aos africanos pelo que foi feito com negros e negras durante a escravidão. A fala ocorreu durante visita oficial à ilha de Gorée, no Senegal, um ponto de saída dos navios negreiros.

Lula foi o presidente brasileiro que teve relação mais próxima com a África. Ainda nesta quarta-feira, ele afirmou que, nos últimos seis anos, nenhum líder brasileiro foi ao continente. Michel Temer (MDB), porém, foi a Cabo Verde, em 2018, para participar de uma cúpula da CPLP, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Já Bolsonaro não visitou a região.

O petista, aliás, deve em breve estar com os líderes lusófonos, uma vez que o grupo tem uma cúpula de chefes de Estado e de governo marcada para este segundo semestre em São Tomé e Príncipe, também na África — o petista já disse que participaria do encontro.

Entre alguns dos líderes lusófonos, há entusiasmo com a volta de Lula ao Palácio do Planalto. Entre eles, o presidente cabo-verdiano. À Folha, no início deste ano, José Maria Neves disse que, com Lula, o Brasil “pode ajudar os africanos a serem muito mais resilientes e a terem uma economia mais inclusiva e sustentável; também pode ter papel nas trocas comerciais e maior investimento da América Latina na África”.

Leia também: Lula vai a Parintins em agosto, confirma presidente do PT no Amazonas
(*) Com informações da Folhapress
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