Em região de tríplice fronteira, Prefeitura de Tabatinga quer show de R$ 700 mil de Wesley Safadão; MPAM tenta barrar

Tabatinga fica em região considerada pelo governo federal como uma das principais rotas do tráfico de cocaína do Brasil (Divulgação)
Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS – Em uma região localizada na tríplice fronteira entre o Brasil, a Colômbia e o Peru, considerada pelo governo federal como uma das principais rotas do tráfico de cocaína do Brasil, a Prefeitura de Tabatinga (a 1.107 quilômetros de Manaus) quer um show do cantor Wesley Safadão no 8º Festisol 2022, evento realizado na cidade entre os dias 25 a 28 de agosto. O Ministério Público do Amazonas (MPAM), no entanto, tenta impedir o espetáculo, por conta do valor a ser pago ao artista: R$ 700 mil.

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Por meio da Promotoria de Justiça de Tabatinga, o órgão ministerial ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP), com pedido de tutela de urgência, para suspender a apresentação, anunciada pelo prefeito do Saul Bemerguy (MDB), em 8 de maio deste ano, durante a festa do Dia das Mães, no município. Segundo o MPAM, o município enfrenta uma situação precária na saúde e infraestrutura e o gasto com o cachê do artista não teria justificativa razoável na atual conjuntura.

“A população de Tabatinga enfrenta precariedade, principalmente, no campo da infraestrutura e saúde. É a primeira vez que um show no município demanda um valor tão alto e, em caso de descumprimento, o contratado deverá devolver os valores pagos com dinheiro público e a multa de 50% no valor contratado”, explicou o promotor de Justiça André Epifanio. 

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Tabatinga tem aproximadamente 68 mil habitantes e, junto com Letícia, na Colômbia, e Santa Rosa, no Peru, forma uma das nove zonas de tríplice fronteira do Brasil. O município amazonense, em 2010, tinha 48,2% da população vivendo com um rendimento mensal per capita de até 1/2 salário mínimo, o que o colocava na posição 50 de 62 dentre as cidades do Estado, de acordo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Educação digna

A ação civil pública, obtida pela REVISTA CENARIUM, foi ajuizada na quinta-feira, 30, pelos promotores de Justiça André Epifanio Martins e Fábia Melo Barbosa de Oliveira. De acordo com o documento, a prefeitura informou que o pagamento do show seria realizado com a celebração de um convênio com o Governo do Amazonas, mas o Ministério Público afirma que a medida não chegou a ser anexada e a justificativa para o gasto não foi apresentada.

Na ação, o MPAM solicita ainda que o município de Tabatinga deixe de efetuar qualquer pagamento com recursos públicos relacionados ao show do cantor Wesley Safadão. O órgão ministerial cita, ainda, que o valor a ser gasto ocorre em um momento em que “crianças e adultos padecem nos hospitais e continuam sem uma educação minimamente digna”.

Para o MPAM, a contratação “viola os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, moralidade, eficiência, proteção ao mínimo existencial, vedação da proteção insuficiente, respaldados em inúmeros precedentes do Supremo Tribunal Federal [STF]”.

“Cabe consignar que, em nenhum momento, o Ministério Público pretende cercear o desenvolvimento das atividades de fomento ao lazer, entretenimento e à cultura neste município e muito menos se imiscuir no mérito de atos administrativos, mas, diante dos valores envolvidos na dita contratação e da extensa relação de compromissos públicos, o caso foge completamente do razoável”, diz trecho da ação.

Casos parecidos

Ainda na ação, o MPAM lembrou que o ministro Humberto Martins, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspendeu um show do Wesley Safadão, no valor de R$ 500 mil, em uma cidade do interior do Maranhão, em abril deste ano, A decisão ocorreu após o STF reconhecer caracterizada lesão à ordem e à economia públicas.

O show aconteceria na cidade de Vitória do Mearim (a 180 quilômetros de São Luís). Segundo o STF, contudo, o ministro Humberto Martins reconheceu que “ficou demonstrada a incompatibilidade entre a despesa de R$ 500 mil com a contratação do evento artístico e a realidade orçamentária do município maranhense”.​​​​​​​​​

“O dispêndio da quantia sinalizada com um show artístico de pouco mais de uma hora, em município de pouco mais de 30 mil habitantes, justifica a precaução cautelar do juiz de primeiro grau, prolator da decisão inicial que suspendeu a realização do show”, afirmou Martins, à época.

Urucurituba

No mês de junho deste ano, após pedido do MPAM, o presidente do STF, Humberto Martins, também proibiu a realização dos shows da dupla sertaneja Bruno e Marrone, no valor de R$ 500 mil, e do grupo Sorriso Maroto, de R$ 200 mil, no município de Urucurituba (a 218 quilômetros de Manaus). No despacho, o ministro alegou haver uma desproporção entre a condição financeira da cidade e os valores a serem gastos com os shows.

Veja também: Mesmo após imbróglio na Justiça, Bruno e Marrone realizam show de R$ 500 mil no interior do Amazonas

Mesmo com a decisão, a prefeitura da cidade conseguiu realizar o show de Bruno e Marrone após acordo com um grupo de empresários que decidiram custear o gasto com o espetáculo da dupla, na 17ª Festa do Cacau. A apresentação do grupo Sorriso Maroto, no entanto, não aconteceu.

Confira a ACP do MPAM sobre Wesley Safadão:

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