Estudos mostram a importância das florestas para as grandes cidades

Área verde de uma metrópole (Reprodução/Freepik)
Da Revista Cenarium*

RIO DE JANEIRO – Ao longo do século 19, o Rio de Janeiro aprendeu, da pior forma, que a devastação de suas florestas nativas poderia comprometer a sobrevivência da cidade. A então capital do império sofria uma crise hídrica. Grande parte da água que abastecia a cidade vinha do Maciço da Tijuca, uma área antes ocupada por floresta tropical que fora muito desmatada para cultivos agrícolas.

Sem a mata para proteger os mananciais, a água que abastecia a cidade passou a rarear. O que se segue é uma história bastante conhecida: o imperador Dom Pedro II decidiu preservar o que restava da mata e reflorestar as áreas degradadas, com mudas que não tivessem “menos de três anos, nem mais de 15 de idade”.

Hoje, mais de 150 anos depois, estudos sobre ecologia, poluição atmosférica e climatologia comprovam como a preservação e expansão de florestas são importantes para as grandes cidades, trazendo benefícios como melhorar a qualidade do ar, amenizar o calor, evitar enchentes e escorregamentos de terra, garantir o abastecimento de água potável e servir como áreas de lazer para a população.

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Estudo recente realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com a Universidade Veiga de Almeida, mostrou que a Floresta da Tijuca pode ajudar a limpar a atmosfera de hidrocarbonetos, poluentes nocivos para a saúde humana.

A pesquisa, realizada entre outubro de 2022 e março deste ano, revelou que o ar coletado no Parque Nacional da Tijuca tinha até sete vezes menos hidrocarbonetos do que aquele coletado em Del Castilho, bairro totalmente urbanizado e sem grandes concentrações de vegetação, localizado a cerca de 5 quilômetros de distância, em linha reta, da Floresta da Tijuca.

O estudo não conseguiu concluir se a floresta funcionava como uma barreira física para o ar poluído ou se sua vegetação tinha um efetivo papel na absorção dos gases poluentes. 

Outro resultado do estudo mostra que a floresta pode ajudar na qualidade do ar mesmo em áreas totalmente antropizadas (alteradas). O ar coletado na Praça Saens Peña, no bairro da Tijuca, localizada a menos de um quilômetro dos limites da floresta continha 2,5 vezes menos hidrocarbonetos do que Del Castilho.

“A Saenz Peña fica a poucos metros da floresta. A floresta está atuando como uma barreira. E, na Tijuca, os ventos vêm do sul, então, passam primeiro pela floresta”, afirma Gabriela Arbilla, pesquisadora da UFRJ que realizou o estudo em parceria com Cleyton Martins da Silva, da Universidade Veiga de Almeida.

Antes disso, os dois pesquisadores haviam estudado o papel da floresta da Tijuca nos gases do efeito estufa. Segundo o estudo, a concentração de gás metano era até 11% maior na área urbanizada do que na região de mata.

O Cristo Redentor na cidade do Rio de Janeiro (Tomaz Silva/Agência Brasil)

Em 2022, um estudo da Universidade Federal do Paraná (UFPR), realizado em três remanescentes de área florestal na cidade de Curitiba, concluiu que a mata colaborava para reduzir o calor em seu entorno. 

A floresta conseguia reduzir, em média, em 0,3°C a temperatura das áreas urbanas localizadas a 200 metros do limite da vegetação. A 50 metros da mata, a temperatura era reduzida em até 0,66°C. 

A organização internacional World Resources Institute (WRI) mantém uma iniciativa chamada Cities4Forests (Cidades para florestas, em português), que busca incentivar a conservação, manejo e restauração de florestas em áreas urbanas e seus entornos. Atualmente, mais de 80 cidades participam do programa, entre as quais, dez brasileiras (São Paulo, Campinas, Belo Horizonte, Extrema, Salvador, Palmas, Macapá, São Luís, Porto Velho e Rio Branco).

Em seu relatório mais recente, publicado em novembro de 2022, a Cities4Forests destaca que existem três tipos de florestas, com base em sua localização em relação à cidade: as internas (situadas dentro das cidades), as adjacentes (que estão no entorno) e as florestas distantes.  

E cada uma tem seu papel. “As florestas internas podem ajudar com questão de drenagem, conforto térmico e lazer. As do entorno têm um trabalho mais forte na questão da segurança hídrica, provisão de água”, afirma o gerente de Desenvolvimento Urbano da WRI no Brasil, Henrique Evers. “Já as mais distantes têm uma relação com a questão climática como um todo. Tem aquele exemplo dos incêndios florestais na Amazônia, em que a fumaça chegou em São Paulo, criando um cenário de filme catastrófico.”

Além disso, as florestas são essenciais para atingir cinco dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ODS): melhorar saúde e bem-estar; garantir água limpa e saneamento; dar sustentabilidade a cidades e comunidades; ter efeito positivo no clima e também na vida terrestre.

O Rio de Janeiro é uma cidade que tem grandes áreas florestais inseridas na mancha urbana, como o Parque Nacional da Tijuca, o Parque Estadual da Pedra Branca e a restinga de Grumari, além de florestas de entorno, como o Parque Estadual do Mendanha. 

Já a cidade de São Paulo, apesar de ter alguns parques urbanos, tem suas principais florestas localizadas nas periferias e entorno, como o Parque Estadual da Cantareira, a Reserva do Morro Grande e a Área de Proteção Ambiental de Capivari-Monos. São essas áreas verdes que garantem boa parte do abastecimento de água potável da região metropolitana, de acordo com a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

Estudo publicado em março deste ano por outra organização internacional, a The Nature Conservancy, destacou a importância de se restaurar a vegetação da região da Cantareira para proteger os mananciais e recuperar matas ciliares, aumentando a segurança hídrica da capital paulista e dos municípios do entorno.

De acordo com a pesquisa, essas e outras soluções baseadas na natureza podem proporcionar ao Sistema Cantareira 33% mais água em períodos de seca. Isso também reduziria os custos econômicos das crises hídricas. No caso específico da seca de 2014/2015, poderiam ter sido evitadas perdas de R$ 443 milhões ou 28% do total das perdas registradas. 

Segundo os últimos dados disponíveis, de 2020, quase 50% do território da capital paulista são cobertos por vegetação. “Nos extremos da cidade, a gente tem a maior quantidade de vegetação, a Cantareira, na região norte; Parelheiros, na região sul; e temos um tanto de vegetação no extremo da região leste. Essas áreas se ligam a outras áreas que compõem o cinturão verde da região metropolitana”, explica a coordenadora da Gestão de Parques e Biodiversidade da Cidade de São Paulo, Juliana Summa.

De acordo com Juliana, existem planos para conservar e ampliar a cobertura vegetal da capital paulista. “Um deles é o plano de arborização urbana, que envolve aumentar a quantidade de árvores plantadas na cidade. Nossa meta é plantar 45 mil árvores por ano. Além disso, temos o plano municipal de áreas protegidas, que inclui a plantação de uma vegetação mais arbustiva para criar um corredor de polinizadores, a implantação de outras praças e a ‘vaga verde’, que é o plantio de mudas entre as vagas de estacionamentos”, conta Juliana.

Também há as compensações ambientais de empreendimentos que envolvem plantio de mudas nas reservas florestais do entorno. Segundo Juliana, é importante que a cidade invista na criação de novos parques e áreas verdes nas regiões mais centrais da mancha urbana paulista. 

Existem, hoje, condomínios em que parte é transformada em parques urbanos públicos. “São Paulo pode ser muito mais verde do que é. As pessoas precisam entender que ter uma área de vegetação próxima da sua casa não é ter uma área suja, de mato, que não serve para nada. Ela tem uma função superimportante para a cidade”.  

Já a cidade do Rio de Janeiro, em seu Plano de Desenvolvimento Sustentável e Ação Climática, prevê realizar o manejo de 3.400 hectares de área reflorestada e consolidar 1.206 hectares de floresta no município até 2030.

Leia também: Mercado de Carbono: Falta de regulação é risco a povos das florestas
(*) Com informações da Agência Brasil
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