Instituições de Jornalismo condenam ‘Repórter de Milhões’ acusado de cobrar por reportagens

Roosevelt Pinheiro é conhecido como 'Repórter de Milhões' (Composição de Paulo Dutra/Revista Cenarium)
Adrisa De Góes – Da Revista Cenarium

MANAUS (AM) – O criador de conteúdo digital Roosevelt Pinheiro, conhecido como “Repórter de Milhões”, foi acusado por moradores afetados por um incêndio no bairro Praça 14, Zona Sul de Manaus, de ter cobrado “cachê” para fazer reportagem sobre as dificuldades e falta de assistência no local. O caso reacendeu o debate sobre a ética jornalística e a formação para exercer a profissão. 

No Jornalismo, assim como em qualquer área ou atividade profissional, há questões éticas que devem ser seguidas. Desde 1949, o Código de Ética do Jornalismo no Brasil estabelece diretrizes e auxilia o jornalista no exercício da profissão, entre elas, o artigo 11, que diz que o jornalista deve evitar a divulgação dos fatos com o interesse de favorecimento pessoal ou vantagens econômicas. 

Trecho do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (Reprodução/Federação Nacional dos Jornalistas)

A presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Katia Brembatti, explicou à REVISTA CENARIUM que, assim como outras profissões, seja na Medicina ou no Direito, por exemplo, existem regras que direcionam a conduta profissional.

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Presidente da Abraji, Katia Brembatti (Divulgação)

“Não temos um conselho, como essas outras profissões têm, mas a gente tem um código de ética. E, por exemplo, neste código de ética está escrito que direitos humanos é primordial para jornalistas, ou seja, não é uma escolha. Não existe bom jornalista, boa jornalista, que despreze questões de direitos humanos, aponta a jornalista.

Brembatti afirma, ainda, que compreender esse ponto significa, de fato, defender os direitos das pessoas como um todo, seja à moradia, ao atendimento digno, à segurança e à educação. A presidente da Abraji aponta, ainda, que hoje o modelo de negócio como o jornalismo está em mutação rápida e é impactado por outras áreas da sociedade.

“O bom jornalismo é aquele que equilibra uma busca saudável por audiência, uma busca de querer ser lido, querer ser visto, querer ser ouvido, com assuntos relevantes, com assuntos que interessam às pessoas, e também menciona assuntos que não vão dar muita audiência. Como, por exemplo, o orçamento da Prefeitura. Como vai ser aplicado? Esse é um assunto que não vai dar clique, mas o jornalismo precisa continuar fazendo”, reflete Brembatti.

De forma ampla, a presidente da Abraji destaca, também, que a população precisa compreender que um bom jornalista, no Brasil, não cobra para fazer uma reportagem. Ela orienta que a área da publicidade é quem deve assumir serviços dessa natureza.

“Uma coisa que é bem importante que a população saiba é que nenhum bom jornalista, nenhuma boa jornalista, no Brasil, cobra para fazer reportagem. A chamada reportagem paga, no sentido de ‘eu vou na sua clínica falar sobre cirurgia de varizes e eu vou te cobrar para fazer uma reportagem sobre isso’, não existe. Existem algumas áreas da publicidade que fazem isso, mas daí não é jornalismo”, explica.

Postura antiprofissional

O presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Amazonas (SJPAM), Wilson Reis, afirmou à CENARIUM que a ética no exercício profissional, nos últimos tempos, tem se mostrado uma aliada importante para que o jornalista possa conduzir da melhor forma o que produz. O sindicato representa a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) no Estado.

Reis apontou a necessidade da graduação em Jornalismo e destacou que a formação de nível superior traz noções da própria ética. O presidente é enfático quanto ao Código de Ética observar que o jornalista deve evitar a divulgação dos fatos para obter vantagens econômicas. 

O presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Amazonas, Wilson Reis (Jander Souza/Revista Cenarium)

“Não é a postura do profissional jornalista cobrar para produzir informação na medida em que a atividade dele em si implica no uso da ética como base dessa própria ação. Então, é extremamente contraditório. A produção jornalística tem que carregar consigo a ética todos os dias e para onde for. Quando você tem um profissional que tem nome no mercado ou até uma própria empresa que tem nome no mercado, ela se destaca, com certeza, no campo ético quando ela o exerce no dia a dia”, afirma Reis.

Acusação e defesa

A acusação foi feita durante entrevista concedida pelos moradores, na quinta-feira, 18, a um site de notícias de Manaus que, em uma transmissão ao vivo pelo Facebook, mostrou os moradores afetados por um incêndio de grandes proporções que destruiu 11 casas e atingiu 26 famílias.

Ao relatar o prejuízo causado pela tragédia, uma das moradoras afirmou que Roosevelt Pinheiro pediu gasolina para se deslocar ao local e fazer a reportagem. “Teve reportagem, a ‘reportagem de milhões’, que cobrou gasolina para vir aqui ou que a gente fosse se deslocar daqui para buscá-lo. Isso está errado. Ele cobrou para vir aqui e isso não pode acontecer. A gente está aqui no sufoco, todo mundo, e ainda vem cobrar?”, disse a moradora. Assista abaixo.

Após a repercussão, o criador de conteúdo se manifestou nas redes sociais e disse que apenas estava “brincando”. Roosevelt negou ter cobrado para fazer a reportagem e enfatizou que a situação não passou de um mal-entendido.

“Essa informação não procede. O combinado com a Fran foi buscar e me deixar. Em nenhum momento cobrei nada. Meu erro foi ironizar no áudio com a outra pessoa. Falei que a Fran iria pagar meu cachê e da Jucinha. Mil para cada, almoço e gasolina, mas não procede. Era uma brincadeira e a pessoa interpretou errado”, justificou o “Repórter de Milhões”.

Série de polêmicas

Roosevelt Pinheiro ganhou notoriedade nas redes sociais ao expor, em uma série de vídeos que viralizaram pelo País, a imagem da jovem Daniela Monteiro, conhecida como “Buiú do Coroado”, que possui transtornos psicossociais e, recentemente, voltou de São Paulo, onde fazia tratamento em uma clínica para dependentes químicos.

Os vídeos mostram Roosevelt realizando perguntas para Daniela e pedindo opinião sobre uma série de assuntos, com objetivo de explorar a imagem da jovem de forma cômica. No entanto, ela responde de forma objetiva e, na maioria das vezes, demonstra confusão, sendo pouco colaborativa.

Não é a primeira vez que o “Repórter de Milhões” protagoniza polêmicas. Ano passado, um vídeo divulgado nas redes sociais mostrou o criador de conteúdo simulando dar uma “pedra” para uma mulher em situação de vulnerabilidade social e dependente química. O vídeo viralizou negativamente e, ao se defender das acusações, ele justificou que o caso foi divulgado com “informações incompletas”.

No mesmo ano, o influencer foi criticado por invadir o carro da cantora gospel Aline Barros quando a artista realizou um show em Manaus durante a Marcha para Jesus. A cena mostrou o blogueiro com um microfone nas mãos, sendo filmado por um cinegrafista contratado por ele. De forma inesperada, ele vai contra os seguranças e entra no carro da artista. Assustada, a cantora gospel entra no veículo e, de forma educada, responde às perguntas de Roosevelt.

Leia mais: Sindicato dos Jornalistas do AM encaminha apoio à PEC do Diploma para Assembleia Legislativa
Revisado por Adriana Gonzaga
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