Seminário marca a retomada da luta pelos territórios indígenas

Lideranças como Sonia Guajajara, Célia Xakriabá e o coordenador-executivo da Apib, Dinamam Tuxá, estão participando do seminário em Brasília (Reprodução/Pedro Magalhães/Apib)
Mencius Melo – Da Revista Cenarium

MANAUS – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) realiza entre os dias 3 e 6 de abril, no Centro Cultural Missionário, em Brasília, no Distrito Federal, o seminário “Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas” (PNGATI). O evento conta com a participação de diversas organizações indígenas e indigenistas e é uma iniciativa da Apib, consolidada pelas regionais de base com a participação de oito organizações, como o Instituto Socioambiental (ISA) e o Instituto Iepé, entre outras.

O encontro na capital federal marca a retomada da política nacional de gestão territorial e ambiental de Terras Indígenas e os participantes têm como pauta central discutir ferramentas de controle, implementação e gestão da PNGATI e seus mecanismos de financiamento. Os participantes se dividem em Grupos de Trabalhos (GT’s) e debatem na plenária do evento. Ao final, os participantes irão elaborar um documento com propostas para o ano de 2024.

A plenária do seminário da Apib, em Brasília, conta com a presença de lideranças indígenas e indigenistas (Reprodução/Pedro Magalhães/Apib)

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O coordenador executivo da Apib, Dinaman Tuxá, fez um desabafo durante a abertura do seminário: “Este momento é muito importante para os povos indígenas, pois marca o retorno do debate sobre gestão territorial e ambiental de Terras Indígenas longe do desgoverno Bolsonaro. Estamos unindo forças para combater tudo o que foi negligenciado pelo Estado Brasileiro nos últimos quatro anos e construir o futuro indígena a partir da demarcação dos territórios e da garantia dos direitos ancestrais”, declarou.

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Negação

Para o antropólogo Alvatir Carolino, em entrevista à REVISTA CENARIUM, a luta pela terra é uma herança histórica. “A relação do Estado brasileiro com as populações indígenas, em um primeiro momento, é a de negação. A primeira lei de terras de 1850 estabeleceu categorias dos povos originários e garantiu direitos, mas os obrigou a ter o registro cartorial e a possuir medidas do terreno por um profissional agrimensor, o que, obviamente, era uma pegadinha de aspiração liberal, pois os categorizou, juridicamente falando, mas não os tornou, efetivamente, donos da terra”, observou.

Os grupos de trabalho debatem e estudam os mecanismos da política nacional de terras indígenas (Reprodução/Pedro Magalhães/Apib)

Em sua análise, ele continuou: “Na virada para o século 20, vamos ter algumas perspectivas mais humanizadoras pelo Marechal Rondon, os Villa-Boas e a figura de Darcy Ribeiro, mas foi a Constituição de 1988 que, realmente, consolidou o direito de territorialidades dos povos originários; ainda assim, o direito anda a passos lentos, o que não permite achar que não houve avanços”, ponderou. “O problema é que são muitos problemas, entre eles, a especulação imobiliária, as fazendas de monocultura, os madeireiros, o garimpo, grandes obras privadas e públicas”, elencou Carolino.

Para Alvatir, o seminário da Apib é necessário. “Agora, estamos tomando conhecimento amplo de todas as consequências desumanas sobre os povos indígenas e órgãos como Ibama, Funai e demais, que precisam ter uma atuação mais efetiva, porém, é muito mais importante o estabelecimento da política nacional de gestão territorial e ambiental das terras indígenas, pois é isso que coloca os indígenas na condição da autoafirmação sobre a sua territorialidade, de autonomia sobre a sua territorialidade, pois é isso que os permite, em suas terras, que possam pensar estratégias de proteção e possibilidades de mercado”, apontou.

Na agenda do seminário da Apib estão temas como o controle de ferramentas e de financiamentos das políticas de demarcação de Terras Indígenas (TIs) (Reprodução/Pedro Magalhães/Apib)

Protagonistas

Por fim, o antropólogo concluiu: “Os indígenas devem se tornar os protagonistas para pensar a gestão e o desenvolvimento de suas terras. É preciso colocá-los para planejar, executar, desenvolver e proteger as suas terras, porque a eles foi negado, no passado, a possibilidade de serem humanos, quando foram reconhecidos humanos não foram considerados cidadãos e quando foram reconhecidos cidadãos negou-se a territorialidade e, por fim, devolveu-se as terras, mas não se mostrou o que fazer diante de uma nova realidade. Hoje, essa decisão pertence a eles”, finalizou Alvatir.

O Seminário PNGATI conta com a presença de lideranças indígenas de todas as regiões e representantes do executivo e do legislativo federal, como as ministras Sonia Guajajara, do Ministério dos Povos Indígenas; Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança do Clima; além de Joênia Wapichana, presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai); Weibe Tapeba, à frente da Secretaria de Saúde Indígena; e a deputada federal Célia Xakriabá.

Além de Dinamam Tuxá, Kleber Karipuna e Val Terena, também coordenadores executivos da Apib, participarão do evento. A PNGATI é uma política pública vinculada à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Foi criada por decreto presidencial em 2012. Ela é a primeira política indigenista construída de modo participativo e representa um avanço na gestão autônoma e sustentável dos territórios indígenas no Brasil. O seminário da Apib busca retomar o controle dessa ferramenta, considerada fundamental para o futuro dos indígenas do Brasil.

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