Novo coordenador da Univaja é contra interferências políticas na Sesai e Funai

Novo coordenador da Univaja, Bushe Matis (José Medeiros/Agência Pública)
Ívina Garcia – Da Revista Cenarium

MANAUS – Nascido na aldeia Bueno, na Terra Indígena do Vale do Javari, Bushe Matis, 36, assumiu a Coordenação da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) após a realização da Sétima Assembleia Ordinária, que ocorreu na Aldeia Paraná, no Rio Itui, no município de Atalaia do Norte, (distante 1136 km de Manaus) entre os dias 18 e 21 de março.

A nova coordenação tem Varney Todah Kanamari como vice-coordenador, que exerce mandato até 2025, quando uma nova assembleia deve ser feita. Com a participação dos povos Mayuruna/Matsés, Matis, Marubo, Kulina Pano, Kanamari, e os povos de recente contato Korubo e Tsohom Dyapá, houve empate e a eleição foi decidida com o voto dos indígenas Korubo, que participaram, pela primeira vez, da assembleia.

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Novo coordenador da Univaja, Bushe Matis (José Medeiros/Agência Pública)

O novo coordenador da Univaja é da etnia Matis, considerada ainda de recente contato. Ele entrou no movimento indígena a partir de um convite para trabalhar como tradutor da língua Matis para o português, em movimentos de reivindicações e cobranças do Estado. Em 2021, Bushe passou a prestar serviços para a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), como colaborador na proteção e monitoramento da Terra Indígena (TI).

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No mesmo ano, o indígena prestou Processo Seletivo da Funai para o cargo de supervisor dos agentes de proteção etnoambiental, dando apoio na coordenação de frente de proteção, atuando na criação de barreiras sanitárias, durante a pandemia da Covid-19.

Bushe é bacharel em Administração pelo Centro Universitário Anápolis, em Goiás, onde conseguiu bolsa integral gratuita e fez especialização em Gestão Pública, pela Universidade Estadual do Amazonas (UEA).

À CENARIUM, o novo coordenador da Univaja falou sobre quais serão as prioridades da nova gestão, ressaltando as atividades ambientais, a proteção de indígenas isolados e a preservação da cultura e identidade.

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Veja a entrevista com o novo coordenador da Univaja:

REVISTA CENARIUM – A partir do dia 6 de abril, o senhor assume a Univaja. Quais suas metas para esse começo?

Bushe Matis – Primeiro, vamos criar uma Comitiva do Javari, para participar do Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília, que é o maior movimento nacional que sempre participamos, reivindicando, junto com outros povos do Brasil. Então, vamos fazer isso nesse primeiro momento. Também vamos criar uma equipe da Univaja para deslocar nas regiões da Terra Indígena do Vale do Javari, levando informações sobre políticas indígenas e o que acontece em nível nacional e estadual. Essas informações que temos em nossas mãos queremos levar para nossos velhos e mulheres que estão nas aldeias sem saber o que acontece no nosso País e mundo afora.

Ao mesmo tempo, queremos ouvir as falas, reivindicações e cobranças e a partir disso, elaborar a demanda conforme o que eles pedem, de cada povo, que seria posteriormente apresentado às instituições governamentais que são responsáveis por executar essas ações, e aquilo que o governo não tiver condições de ajudar, vamos buscar novos parceiros com ONGs e a sociedade civil organizada, para que possamos atender os povos do Javari

RV – Qual a principal urgência dos povos indígenas do Vale do Javari?

BM – Primeiro, queremos repudiar essas interferências dos políticos, senadores e deputados que querem indicar coordenadores na Sesai e na Funai. Então, o movimento indígena vai se posicionar contra isso. Queremos que saia imediatamente a nomeação do coordenador regional da Funai de Atalaia do Norte e o coordenador distrital de saúde indígena do Javari, para continuar o atendimento aos povos indígenas que precisam muito de atendimento, porque sem coordenador não tem muito o que fazer, alguns indígenas estão tendo os atendimentos negados, queremos que saia a nomeação para que os trabalhos atendendo o nosso povo sejam iniciados.

Nossa urgência também é a segurança, proteção tanto aos indígenas quanto aos servidores da Funai. Recentemente, tivemos a comitiva da procuradoria, representantes do governo federal, e a gente vem reivindicando a segurança e a proteção aos servidores e indígenas que trabalham na coordenação da Univaja, são muitos anos solicitando isso, a urgência é instalar a Balsa da Polícia Federal, em Atalaia do Norte, para que a gente possa se sentir seguro.

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RV: A Univaja ganhou visibilidade internacional com o caso Dom e Bruno. Como você pretende utilizar esse holofote para continuar mantendo a atenção na região?

BM – Nós queremos sempre estar falando com jornalistas e pessoas que divulguem nossa situação nessa região. Se continuamos sendo ameaçados, se aquilo que solicitamos, como a presença da Força Nacional e equipes de segurança, estão atuando direto ou não. Então, queremos manter esse informe para que possamos nos sentir seguros, queremos que o mundo continue vendo que no Vale do Javari existe problema, existe falta de segurança e de políticas públicas nas áreas indígenas. Queremos contar com as mídias para que o mundo não desassista o Vale do Javari.

RV – Você tem no currículo experiência com povos isolados e na Funai. Pretende utilizar essa articulação em prol dos povos do Vale do Javari?

BM – O Vale do Javari precisa de atendimento com políticas públicas, na saúde, educação, desenvolvimento, sustentabilidade e proteção territorial, toda a questão do manejo, etnomapeamento… Então o povo do Javari, que são contactados, precisam de mais atendimento, precisam ser assistidos por políticas públicas, diferente dos povos isolados, que têm que proteger e monitorar seus territórios, os rios e coibir a entrada dos invasores, isso é parte do que a gente vem fazendo, proteção e monitoramento, para barrar e coibir os invasores na terra indígena, trabalhamos com os povos isolados dessa forma. Os que são contactados querem ser assistidos pelo Estado, querem atendimento, então vamos trabalhar mais nesse sentido.

RV – Quais medidas o senhor pretende tomar ou como vai articular na questão da segurança dos povos indígenas e servidores da Univaja que estavam ameaçados?

BM – Solicitamos a proteção do Estado, que é a Polícia Federal, Força Nacional, Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para atuação na frente de proteção junto aos povos indígenas e articular com a procuradoria federal e estadual, para que possam ceder mais segurança às pessoas que são ameaçadas tanto indígenas quanto não indígenas.

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